Olá, colegas. Estou inspirado para escrever sobre muitos temas, principalmente sobre a vida e viagens. Entretanto, resolvi refletir um pouco sobre investimentos, já que faz alguns artigos que não falo sobre isso. Não falo diretamente, mas eu creio que assuntos aparentemente não relacionados com finanças pessoais estão interconectados. Para ser mais claro, eu penso que uma vida mais equilibrada, leva a finanças mais equilibradas e isso está diretamente relacionado com independência financeira. O tema deste artigo é câmbio.
O PRINCÍPIO FUNDAMENTAL QUANDO O ASSUNTO É CÂMBIO
Minha sugestão para quem quer apreender um pouco sobre esse assunto: PARE DE LER "ESPECIALISTAS" E SUAS PREVISÕES. Simplesmente, pare. Colegas, os ditos especialistas parecem ignorar, ou simplesmente desconhecer, o fundamento mais básico da taxa de câmbio no médio e principalmente no logo prazo: o poder de compra relativo entre as moedas. Esse assunto foi tratado por mim neste artigo Finanças - Dólar e Ouro. Porém, quero recomendar um outro artigo muito bom do Instituto Mises Brasil sobre o tema: Qual é o valor "correto" do Câmbio?. Leia os artigos, se tiver que optar por um, escolha o do Leandro do IMB.
Leu? Sério, vale muito a pena entender este conceito básico. Quando estudava direito, eu fiquei conhecido entre os professores por ter um bom raciocínio jurídico, ou seja, a capacidade de refletir em termos jurídicos, mesmo que eu por ventura não soubesse a solução legal para o caso. Eu creio que com a avalanche de informações hoje em dia, as pessoas se preocupam pouco com os princípios de qualquer área do conhecimento. Para mim esses são os conhecimentos cruciais. A partir deles você pode elaborar raciocínios mais complexos sobre qualquer tema. O que eu vejo em muitas áreas, são pessoas querendo elaborar pensamentos complexos sobre temas que não compreendem nem os princípios mais elementares. Como não poderia deixar de ser diferente, quando não se entende as fundações de um determinado assunto, não se pode ter opinião própria. Com o avanço da internet, isso ficou evidente e piorado. Muitas pessoas pensam que tem opinião própria, mas apenas estão repetindo algo que leram em algum lugar sem saber muito bem os motivos porque a realidade é de um determinado jeito e não de outro.
Se você, prezado leitor, leu algum dos artigos mencionados, saberá que a principal força condutora do câmbio no longo prazo é o poder de compra das moedas. É por esse motivo, que investir no dólar do Brasil pode ter uma função de proteger o poder de compra do seu patrimônio, mas no longo prazo tem uma expectativa de retorno real (descontado a inflação) próxima a zero.
Imagine que o apartamento onde vivo valha R$100 mil. Vamos supor que a taxa de câmbio real seja de U$1 para R$1 (que bom seria hein!). Vamos supor que a inflação nos EUA e no Brasil seja de zero pelos próximos 10 anos (é apenas um exercício mental). Isso quer dizer que o poder de compra de um dólar será o mesmo daqui 10 anos. Como a inflação no Brasil também foi de zero, isso quer dizer que o poder de compra do real se manteve estável. Se daqui 10 anos, a taxa de câmbio fosse de U$1 = R$2, isso significaria que o meu apartamento, para um americano, estaria custando a metade do preço. Isso não faria nenhum sentido.
Agora imagine que a inflação do Brasil seja de 100% no período. Vamos supor também, algo que é bem razoável, que o imóvel seja resiliente à inflação, ou seja, ele suba de valor na exata proporção da inflação. Assim, o imóvel irá custar R$200.000,00 daqui 10 anos. Se a taxa de câmbio nominal, a que vemos no dia a dia e os especialistas adoram dizer para onde vai, permanece a mesma (R$1=U$1), isso quer dizer que o apartamento, para um investidor estrangeiro em dólar, custaria o dobro. Algo que não faria sentido também, pois a riqueza dobraria sem que houvesse qualquer crescimento real no valor do imóvel.
A COMPROVAÇÃO EMPÍRICA
Difícil entender? Não. Lógico? Certamente. Comprovação empírica? Sim. Quando estava viajando de trem pela parte mais moderna na China (leste), li muitos artigos, estudos e livros. Aliás, como é confortável viajar de trem. Uma pena que o Brasil não tenha trens. Imagine ir de Curitiba a Florianópolis em uma hora lendo confortavelmente um livro? Um desses estudos foi o último relatório do Credit Suisse Internacional de 2015 (acessível aqui). Quem não conhece esses relatórios anuais, recomendo uma verdadeira aula de investimentos, algo que não se encontra nem remotamente no Brasil.
Eu estava fazendo um resumo desse estudo, principalmente sobre os retornos de diversas classes de ativos em quase 30 países. Creio que seria um material bem interessante para provocar reflexões a nós investidores amadores, principalmente porque não há quase nenhum material sobre isso em português. Fiz bastante coisa, mas infelizmente não conseguirei publicar, pois demandaria bastante tempo e acesso à internet. Entretanto, resolvi inserir alguns gráficos, para mostrar se a noção de manutenção de poder de compra das moedas no longo prazo se sustenta em exemplos concretos.
Colocarei alguns gráficos abaixo. Não se preocupem ou prestem muita atenção nas diversas barras. Elas representam os Equity e Bond prêmios, ou seja, o quanto o risco foi recompensado ou não. A única barra que quero que vocês amigos leitores prestem bastante atenção é a azul clara. Essa barra demonstra o quanto uma moeda valorizou ou desvalorizou em relação ao dólar em termos reais, ou seja já considerado a inflação das moedas destes dois países.
Se, por exemplo, num determinado período a barra representar 0.5%, isso quer dizer que no período considerado a moeda valorizou meio ponto por cento ao ano em relação ao dólar, já considerando a inflação das moedas. Isso quer dizer que demoraria algo em torno de 150 anos para a moeda em questão ter uma valorização de 100% em relação ao dólar. Se a barra apontar 0%, isso quer dizer que não houve qualquer ganho ou perda durante o período.
Muitos países são analisados. Infelizmente, nenhum país latino americano. Tentei colocar países diversos, com histórias políticas, econômicas e sociais diferentes uns dos outros. Com diferentes graus de inflação, para saber se o princípio básico de manutenção do poder de compra entre as moedas se manteve ou não.
NOVA ZELÂNDA
Para mim, a Nova Zelândia é o melhor país do mundo para se viver. É simplesmente fantástico e maravilhoso aquele lugar.
Como se pode observar, no período de 115 anos a moeda da Nova Zelândia se desvalorizou -0,2%aa. Isso quer dizer que a moeda da Nova Zelândia perderia metade do seu valor em relação ao dólar, se a tendência permanecesse a mesma, em três séculos, isso mesmo, 300 anos. Nenhum Kiwi vai ficar rico-pobre ou turbinar o seu patrimônio apostando na (des)valorização de sua moeda no longo prazo. Numa tendência de menor prazo (1965-2014), a moeda da NZ apresentou discretíssima valorização em relação ao dólar. Em relação à maravilhosa Nova Zelândia, o princípio básico da manutenção do poder de compra entre as moedas se aplicou quase a perfeição.
DINAMARCA
Ainda não tive a oportunidade de conhecer este interessante país. A Dinamarca, segundo alguns pensadores litbertários, é o pais onde os seres humanos são mais escravos do mundo. Isso porque é o país com a maior tributação em relação ao PIB do mundo. Como qualquer forma, segundo essas pessoas, de tributação é um roubo e uma forma de escravidão do ser humano, essa é a única conclusão lógica para essa forma de pensar. Entretanto, a Dinamarca durante vários anos foi considerado, pelos relatórios da ONU sobre o tema (ver uns dos meus últimos artigos a respeito) o país mais feliz do mundo e todos os seus índices de desenvolvimento humano são impressionantes.
Num período de maior duração, a moeda dinamarquesa mostrou uma leve tendência de alta em relação ao dólar. Num período mais curto de tempo (1965-2014), a moeda se valorizou mais acentuadamente. Esse resultado pode ser encontrado em vários países europeus, e está inserido, eu acho, numa trajetória de enfraquecimento do dólar que vinha desde a década de 80 e apenas nos últimos anos está se revertendo.
A África do Sul é um país de contrastes. A Cidade do Cabo é uma das cidades mais bonitas que já estive na vida. Por seu turno, a capital Johanesburgo é uma das cidades mais perigosas do mundo. Um apartheid que não existe mais na lei, mas existe na realidade (presenciei várias cenas de enfrentamento aberto ou velado entre negros e brancos). Um país rico em recursos, mas ainda com uma população muito pobre. Em certa medida, esse país Africano tem semelhanças fortes com o nosso país.
A moeda da África do Sul apresentou uma tendência de desvalorização permanente em relação ao dólar. Num país com tantos problemas, que esteve à beira da guerra civil no começo da década de 90 e com tantos problemas sociais e econômicos, uma desvalorização real de -0,9%aa não é tão severa. Mesmo nesse caso, parece claro que o princípio do poder de compra entre as moedas se sustenta, ou ao menos é um ótimo ponto de partida para análise.
SUÍÇA
Ah, a Suíça. Destino favorito para o dinheiro dos políticos brasileiros. Este país é belíssimo. Os dias que passei fazendo trilhas na região de Interlaken foram extraordinários. Cidades lindas, infra-estrutura de primeiríssimo mundo e uma natureza esplendorosa. Ainda há queijo e chocolate de qualidade. Quem precisa mais? Eu, particularmente, não gostaria de morar na Suíça. Além de ser caríssimo, creio que não é o tipo de lugar que gostaria de criar meus filhos, pois sinto que falta algo nas relações humanas, mas essa é apenas minha opinião particular. A Suíça foi um bastião de segurança. Bons retornos financeiros e uma moeda extremamente forte. Foi o país com menor inflação do mundo nos últimos 115 anos.
Se a moeda da África do Sul teve uma tendência de desvalorização contínua, a moeda Suíça é o oposto. Impressionante o desempenho da moeda Suíça ao longo do tempo. Apesar de ser o país com menor inflação, um dos bastiões mais fortes de estabilidade política e financeira, a valorização em relação ao dólar existiu, mas também não foi algo espetacular. Isso, em minha opinião, corrobora o princípio.
Já tive a oportunidade de ir algumas vezes para Espanha. Entre os países europeus, com certeza, junto com Portugal, é o país que tem mais semelhança com o nosso. Muitos dos problemas, e das qualidades, que possuímos como povo, está presente em maior ou menor grau nos portugueses e espanhóis. O gráfico de Portugal é muito semelhante com o gráfico da Espanha. Assim, ao olhar o gráfico abaixo pode-se ter em mente a nação lusitana.
Numa tendência de maior prazo, o retorno foi de zero por cento. Isso acontece com vários países analisados no relatório em comento. Numa tendência de mais curto prazo, há a valorização. Mas como dito anteriormente, vários países europeus apresentam o mesmo comportamento no período em tela (1965-2014).
UMA ESTRATÉGIA DE INVESTIMENTO EM MOEDAS
PARA O INVESTIDOR COMUM
“Ok, Soul, acho que entendi a mensagem, o que, como investidor amador posso fazer diante de tudo isso?”. Se , enquanto investidores não profissionais e sofisticados, entendermos esse princípio básico da taxa de câmbio, fica muito mais fácil colocar esse ensinamento nas nossas estratégias de investimento de forma mais concreta.
Primeiramente, o dólar tende a ter uma valorização real nula ou muito pequena no médio-longo prazo. Sendo assim, comprar dólar como forma de ganhar dinheiro é algo que não se sustenta no longo prazo. Aqui estou falando de dólar, mas o princípio se aplica a todas as moedas. Aliás, se a ideia é proteger o patrimônio, faz muito mais sentido ter uma cesta de moedas e não apenas dólar.
Se a pessoa quiser fazer uma grande remessa ao exterior de uma só vez, creio que vale a pena levar o conceito de câmbio real muito a sério. Isso vai evitar que pessoas comprem dólar em momentos de extremo pessimismo e façam um terrível negócio. Alguém se lembra do tom alarmista de muitos blogs de finanças? O dólar iria a R$5,00. Quem queria emigrar era o fim da chance de sair do país. Quem agiu de forma emotiva, sem conhecer o princípio básico a regular a taxa de câmbio no médio-longo prazo, amarga prejuízos financeiros substanciosos. É claro que agora há sempre várias explicações: lava jato, impedimento presidencial, Brexit, crise turca, juros nos EUA, etc, etc. Isso nada mais é do que um erro de julgamento, um dos mais básicos. Chama-se Hindsight Bias e já foi abordado nesse blog Hindsight Bias - O que os Jornais de 20 anos atrás podem nos ensinar.
Logo, se quer investir no exterior uma grande parcela de uma única vez e a taxa de câmbio real estiver esticada em favor do dólar, espere, aguarde. Mantenha o seu dinheiro em algo que mantenha ao menos o poder de compra. No Brasil, ainda há um bônus que o investidor pode fazer isso ganhando juros reais muito altos. Se a taxa de câmbio estiver mais ou menos onde era deveria estar (algo em torno de 5% para mais ou menos), a compra de dólar, ou outra moeda, será feito sem grandes riscos. Quando a taxa de câmbio real estiver abaixo do valor, talvez seja o momento ideal de comprar dólar, até mesmo pessoas que querem apenas aproveitar uma boa taxa de câmbio.
Como saber a taxa de câmbio real? Você pode fazer isso na mão pegando as taxas de inflação das moedas que quiser analisar. Em relação ao dólar, o Banco Central do Brasil possui essa estatística. É a série temporal 11573 - Índice da Taxa de Câmbio Real. Eu, infelizmente, não consegui acessar a série. Tentei de várias maneiras, e não sei se é problema no meu computador ou problema na pecinha (aquela que fica entre o computador e a cadeira). Portanto, resolvi pegar dois gráficos de outro bom artigo do IMB escrito no ano passado (O Dólar está caro?). Como o artigo é de agosto de 2015, a informação vai até a metade do ano passado apenas.
Este primeiro gráfico é a série temporal do Banco Central. Ela começa com a estabilização monetária em 100. Sempre que a taxa de câmbio estiver abaixo de 100, isso quer dizer que o nosso real está valorizado. Quando estiver acima, subrevalorizado. É evidente que o câmbio estar um pouco acima ou abaixo não é indicativo forte de alguma inconsistência. Porém, quando se abre gaps de 15-20%, ou seja quando esse indicador estiver em torno de 80 ou 120, é algo muito forte para compra (venda) de dólares.
Percebam que em 2002, antes do Lula ser reeleito, esse índice chegou a quase 200, o que é algo espantoso. Não é à toa que investidores estrangeiros fizeram a festa no país. Até o meu pai percebeu esse tamanho desvio e ganhou dinheiro em várias fontes (no Ibovespa, comprando Bonds brasileiros a 50% do valor de face e também no câmbio). Isso é muito raro de acontecer. Um índice de 200 hoje em dia, equivaleria a um dólar próximo de R$7,00. Essa foi a distorção que ocorreu.
O nosso real ficou durante muitos anos valorizado. E nunca vi nenhum comentarista chamando atenção para esse fato. Se o câmbio derreteu com o PT no comando, também aproveitamos a nossa moeda valorizada no governo do mesmo PT.
Este outro gráfico muito interessante, mostra a diferença entre o câmbio real (linha vermelha) e o câmbio nominal ( linha azul - aquele que a impressa, analistas e quase todos se debruçam e dão opinião). Veja que na crise de 2002, quando o câmbio real era de R$1,85, o câmbio nominal chegou a espantosos R$3,81. Agora, percebam também que em meados de 2011, o câmbio nominal estava em apenas R$1,56, quando o câmbio real apontava um valor de R$2,54.
Analisem também que de 2006 a meados de 2015 (quando o real começou a sofrer uma grande desvalorização), ou seja por quase uma década, a taxa de câmbio nominal estava abaixo da taxa de câmbio real, e durante muitos anos, muito abaixo. Não é à toa que o Lula foi tão popular. Nós ficamos mais ricos, nosso dinheiro valeu muito mais, mesmo que a nossa produtividade tenha estagnado. Foi apenas uma ilusão causada pelos infindáveis ciclos de variação do câmbio. Porém, antes de reclamar do câmbio atual, olhe para os últimos 10 anos e perceba que a taxa de câmbio foi extremamente favorável.
CONCLUSÃO
Colegas, sigam o princípio lógico, e comprovado pelos exemplos históricos, de que as moedas no médio-longo prazo representam o valor de compra entre elas. Mas e no curto prazo? Colegas, isso você pode perguntar para alguém que lê o horóscopo, gráficos de tendência ou acha que pode analisar milhões de informações complexas e contraditórias e extrair algum sentido disso tudo.
Talvez existam profissionais com ferramentas sensíveis e algoritmos complexos que consigam saber o efeito que uma tentativa de golpe frustada num país tão importante como a Turquia, combinada com um ataque terrorista na Alemanha, etc, etc pode ter na taxa de câmbio do Rand da África do Sul. Você, eu, e quase todos os ditos "especialistas" que falam à imprensa, não são essas pessoas.
Defina suas prioridades. Os motivos de querer alocação em moeda estrangeira, ou em ativos estrangeiros (o que faz mais sentido para mim). Não se deixe levar por otimismo ou pessimismo exagerado, e a série fornecida pelo Banco Central é um excelente guia e um grande antídoto para isso. Use ao seu favor. A lógica e os exemplos históricos estarão ao seu lado.
obs: depois de ficar alguns dias na Capital da Mongólia fazendo preparativos, amanhã saio para uma das maiores aventuras da minha vida. Eu, minha companheira e uma amiga, mais um motorista Mongol que fala pouquíssimo Inglês, iremos para uma das regiões mais remotas e belas do planeta terra: O Oeste da Mongólia. Para se ter uma ideia, são cerca de 150 mil pessoas que habitam uma região do tamanho da França. Dezenas de lagos, dezenas de montanhas nevadas, caçadores que usam águia (90% dos humanos que fazem isso estão nessa região), caminhadas desafiadoras e "estradas" que pelo que procurei me informar às vezes levam 7-8 horas para andar 100km. Teremos que acampar na maioria dos dias, pois não há nem mesmo Ger para ficar em vários lugares. Há lagos que não estão nem no mapa. Serão de 25 a 30 dias inesquecíveis por vários motivos, tenho certeza. Não conseguirei postar nada, pois não terei acesso a internet. Em pequenas vilas, se conseguir algum acesso a internet tentarei liberar os comentários. Prometo que responderei todos os comentários assim que tiver oportunidade.
Grande abraço a todos!