segunda-feira, 25 de janeiro de 2016

IMÓVEIS - FUNDAMENTOS: ESCRITURA E REGISTRO IMOBILIÁRIO

 Olá, colegas! No artigo de hoje escrevo um pouco sobre a documentação exigida pela nossa legislação quando se trata de imóveis, bem como esclareço uma confusão muito comum cometida por quase todas as pessoas sem conhecimento técnico da área. Qual seria? Dizer que um imóvel não tem escritura. Para entendermos a razão disso, é preciso detalhar, nem que seja superficialmente, alguns conceitos jurídicos.

  Um dos princípios basilares do direito privado é a autonomia da vontade. Basicamente, significa que as partes envolvidas em qualquer tipo de negociação são autônomas para livremente pactuarem o que bem entenderem. Evidentemente, e sendo o Brasil um país com uma grande tendência paternalista, há inúmeras exceções a essa regra. O Direito do Trabalho é um exemplo disso. Há relativa autonomia para se negociar um contrato de trabalho, que nada mais é do que um contrato de prestação de serviços, já que há diversas disposições legais sobre o que pode e o que não pode constar num contrato regido pela Consolidação das Leis Trabalhistas, também conhecida como CLT, independente da vontade dos contratantes. Há diversas outras exceções em nosso sistema jurídico, mas a toda evidência não é a intenção desse artigo discorrer sobre elas.

  Assim, caso não haja nenhuma disposição legal em contrário, dois indivíduos capazes juridicamente (há variados casos de incapacidade jurídica como menores de idade, pródigos, alienados mentais, etc) podem transacionar o que bem entenderem.  E a forma como esses acordos de vontade se dão? Pode ser qualquer coisa? Um guardanapo  com um rascunho de negócio serve como prova de um contrato de 500 mil reais ou não? Aqui, mais uma vez, a regra geral será que a vontade dos indivíduos poderá ser expressada de qualquer forma, seja verbal ou escrita, para que haja a perfectibilização de um negócio jurídico. Logo, não há teoricamente problemas de fazer qualquer contrato de forma verbal, a única dificuldade é relacionada a prova da existência desse contrato. Isso é um ponto interessante, pois muitas pessoas, inclusive operadores jurídicos com uma técnica não tão apurada, confundem a existência do direito com a prova deste mesmo direito, o que são coisas completamente diferentes. Portanto, um contrato verbal é juridicamente válido, porém difícil de ser comprovado num processo judicial sem que haja outros meios de prova.

  Entretanto, a legislação brasileira excepciona alguns casos nos quais a forma de celebração de um acordo não é livre, mas sim determinada pela lei de antemão.  É nessa categoria de contrato que entra as negociações de bens imóveis. A nossa legislação, mas especificamente o Código Civil Brasileiro, determina que os negócios jurídicos envolvendo imóveis devem ter a forma pública. O que isso quer dizer? Isso significa que para se comprar um apartamento, por exemplo, é preciso que haja um contrato escrito feito por um cartorário, sob pena do negócio não ter validade jurídica.  Isso não se aplica a um veículo automotor, por exemplo. Alguém pode vender uma BMW por 250 mil reais e o contrato ser verbal. Não se pode comprar, todavia, do ponto de vista da validade jurídica, um Kitinete de R$50 mil reais sem a feitura de um contrato com assinatura de um tabelião. A razão disso  é o  art.108 do Código Civil:

"Art. 108. Não dispondo a lei em contrário, a escritura pública é essencial à validade dos negócios jurídicos que visem à constituição, transferência, modificação ou renúncia de direitos reais sobre imóveis de valor superior a trinta vezes o maior salário mínimo vigente no País."

  Antes de mais nada, como tudo em direito, há exceções (como transações regidas pelo SFI - Sistema Financeiro Imobiliário, um resumo das exceções pode ser visto aqui), porém a regra geral é que negócios imobiliários devem ser feitos por meio de pública forma, ou escritura pública. Até mesmo se um pai quiser doar uma casa para o único filho,  por exemplo, tal ato deve ser feito por meio de escritura pública. 

  Logo, colegas, a frase “o imóvel não tem escritura não possui qualquer sentido jurídico. A escritura, pública no caso por determinação legal, é apenas a forma de se materializar um negócio jurídico envolvendo imóveis. Se assim o é, "por qual motivo quase todo mundo repete a mesma coisa?", alguém pode estar pensando. O que as pessoas querem dizer é registro imobiliário, não escritura.

  O que é o registro imobiliário? Nada mais é do que um cadastro de todos os imóveis que existem numa determinada região. Assim, o 2 ofício de registro de imóveis da cidade de Criciúma-SC, por exemplo, é o local onde estão cadastrado todos os imóveis pertencentes a uma determinada região (geralmente essas subdivisões entre regiões são feitas por lei) da cidade catarinense em questão. Qualquer imóvel que ali exista deve estar registrado no registro de imóveis competente.

  Se todos os imóveis já se encontram registrados, como um novo imóvel pode vir a existir em relação ao Registro de Imóveis? Com a criação de um “RG" próprio, que tecnicamente é chamado de matrícula imobiliária.  Alguém possui um terreno de 10.000 m2 e quer dividir em dois terrenos de 5.000m2, como fazer? É preciso extinguir a matrícula imobiliária do terreno maior, e criar duas novas matrículas imobiliárias dos terrenos menores. Sendo assim, o terreno de 10.000m2 deixa de existir juridicamente, havendo agora dois imóveis novos de 5.000m2. É assim que se faz grandes loteamentos de terra, divergindo apenas na burocracia, pois loteamentos maiores de terra (loteamento na acepção jurídica é quando há divisão em terrenos menores com passagem de algumas áreas para a municipalidade para a feitura de obras públicas) envolvem mais etapas jurídicas e documentos do que um simples fracionamento de um terreno.


  Na matrícula do imóvel irá existir todas as informações sobre o mesmo: dimensões, quem foi o primeiro dono, se há cláusula de usufruto, averbação de alguma ação judicial, etc, etc.  É por meio da matrícula imobiliária que se consegue descobrir se há algum problema jurídico ou não, e quem é o dono de direito do imóvel. Essa última frase é essencial: para a legislação brasileira só é dono de um imóvel quem possui o mesmo registrado no competente registro imobiliário em seu nome. Se não está registrado no nome, juridicamente não se é dono do imóvel, simples assim.

  Para aclarar mais esses conceitos, vamos imaginar o exemplo do terreno já citado. Vamos supor que o terreno de 10.000 m2 esteja devidamente registrado com matrícula imobiliária e esteja no nome de João. Vamos supor que João queira vender o terreno, mas tenha percebido que se ele vendesse o terreno em duas metades distintas,  poder-se-ia conseguir mais dinheiro. João poderá vender dois terrenos, mesmo que ele não tenha feito o processo de fracionamento no Registro Imobiliário com a criação de duas novas matrículas e a extinção da matrícula do terreno maior? A resposta jurídica correta é não, pois na verdade está se vendendo algo que não existe do ponto de vista jurídico. 

  Se João encontrar um interessado em comprar metade do seu terreno (como um imóvel autônomo, não em condómino, pois nesse caso não haveria problema jurídico algum), nenhum cartorário irá lavrar escritura pública de compra e venda, pois simplesmente como não há matrícula imobiliária, a metade do terreno não existe como um imóvel autônomo. Não há como se tornar juridicamente proprietário de apenas metade do imóvel de 10.000 m2, sem haver o fracionamento do terreno no registro de imóveis, com a criação de uma nova matrícula.

  “Soul, como assim não pode? É o que mais se tem em vários lugares do Brasil!”. É verdade. Porém, essas transações são feitas à margem da lei. Se alguém compra um terreno sem que esse tenha uma matrícula própria, para o direito brasileiro ele não será o dono do terreno.  Evidentemente, há riscos em situações como essa. 

  Se eu quero comprar um apartamento que esteja devidamente legalizado  com matrícula própria (posso escrever um artigo específico sobre como funciona tudo isso em condomínios de unidades autônomas), é muito fácil se precaver. Basta pedir uma certidão atualizada da matrícula imobiliária,  ver se o vendedor é realmente o dono (vocês ficariam espantados na quantidade de pessoas que cometem erros banais como esse, de compras minhas de imóveis em leilões já peguei dois casos onde houve erro grave nesse quesito, inclusive por imobiliárias), se há algum ônus sobre o imóvel, etc. Como a forma do negócio deve ser pública, ou seja por escritura pública, depois de concretizado o negócio basta levar a escritura para registro no Registro de Imóveis. Se houver um due diligence básico, a chance de dar problemas é quase zero.

 Agora, se uma pessoa compra um imóvel sem este ter matrícula, fica muito difícil saber se o imóvel pode ter algum problema, ou se o dono é realmente o vendedor. Além do mais, nada impede que o vendedor já tenha vendido o mesmo imóvel para mais de uma pessoa, aliás esse tipo de prática não é incomum. Não há absolutamente nada que se possa fazer para extirpar 100% esse risco, não há como. É por isso que terrenos sem matrícula, sem registro próprio, são mais baratos. É a velha relação, bem conhecida pelos leitores desse blog, entre risco x retorno.  Pode-se ganhar dinheiro com isso, como em qualquer outra coisa. Se a pessoa tiver conhecimento e paciência, pode-se comprar terrenos e “legalizá-los”, ganhando um belo dinheiro em cima. É um nicho, como comprar imóveis em leilão, empresas em dificuldade, importação e exportação. Não há nenhum problema, desde que a pessoa saiba o que esteja fazendo, bem como possua check-lists para ao menos diminuir substancialmente o risco de perdas maiores.

   Além do mais, imóveis que não possuem matrícula não podem ser usados como colateral. Em finanças, sempre que ouvir o termo “colateral" pense em garantia. Ninguém pode financiar a compra de um imóvel sem matrícula, pois nenhum banco emprestará dinheiro tendo como garantia um imóvel que não existe do ponto de vista jurídico. A questão é tão séria que muitos economistas de renome aludem que a informalidade fundiária em muitas comunidades pobres é algo que estanca e muito a possibilidade de crescimento econômico. Nisso, eles parecem ter toda razão. Quanto mais confiança e estabilidade jurídica, mais próspera é uma nação. Logo, quanto mais desconfiança e instabilidade jurídica, menos próspera é uma nação. Portanto, uma forma de se criar um dinamismo muito maior na economia, seria proporcionar formas de regularização fundiária, porém não irei me alongar nesse interessante tópico, mas posso voltar qualquer dia.


  Há muitos outras temas relacionados que poderia abordar , mas vou ficando por aqui para que o artigo não se torne desnecessariamente longo. Se achar que o texto foi de valia para algumas pessoas, pretendo escrever outros a respeito  de aspectos mais fundamentais em relação a imóveis para trazer um pouco mais de luz sobre o tema. Portanto, quando ouvir novamente alguém dizer “o imóvel não tem escritura”, pergunte para o interlocutor se ele na verdade não está querendo dizer matrícula imobiliária, se ele não entender, você, prezado leitor,  já é capaz de explicar os motivos.

  Grande abraço a todos! 



domingo, 17 de janeiro de 2016

AS CONEXÕES IMPREVISÍVEIS DA VIDA E BLOGS NOTÁVEIS

  Olá, colegas! Espero que estejam todos bem.  Minha estada na Tailândia que deveria durar duas semanas já passa de um mês e ainda devo ficar mais algumas semanas. Muito bom estar por aqui.  Neste artigo, entretanto, escrevo sobre como um comentário de um Anônimo, que se identificou como Victor, fez-me revisitar alguns estudos, ler muitos outros e criar um contato muito maior com blogs realmente notáveis.

Na magnífica cidade histórica de Sukhothai (primeira capital do que se pode chamar culturalmente de Tailândia há 700 anos). O espetacular Buda leva o nome de "Subduing Maya". Mais explicações abaixo


 Isso é muito interessante mesmo. Como um comentário em uma postagem pode ser o catalisador de algo bacana. A vida muitas vezes, talvez na maioria das situações, opera por “caminhos misteriosos”. É simplesmente impossível saber o que vai ou pode ocorrer com nossas vidas, e o controle é simplesmente uma ilusão, algo maravilhosamente retratado na cena do acidente da bailarina no estupendo filme “ O Curioso Caso de Benjamim Button”. A mesma temática é mostrada de forma muito assaz no filme “Instinto" com Antony Hopkins. A cena dele ameaçando tirar a vida de um psiquiatra se o mesmo não respondesse qual ilusão ele tinha acabado de perder é fantástica. O conceito de Ilusão - Maya -  é central para o Budismo e qual não foi a minha surpresa ao ver um shopping luxuoso com nome de Maya na cidade onde atualmente estou no norte da Tailândia: Chiang Mai. Não deixa de ser interessante colocar um nome como esse em um dos lugares que mais promove a ilusão no mundo contemporâneo.

Esse filme tem uma cena sublime (sempre me emociono), quando ele é capturado no meio dos Gorilas e um deles morre.

Esse é um belo filme. Há muitas cenas interessantíssimas. Uma das que mais me fazem refletir é a da cena do acidente e a cadeia de eventos completamente fora de controle que levou ao incidente. Uma reflexão bem parecida é feita no clássico livro "A Insustentável Leveza do Ser".


  Outro anônimo, o qual eu agradeço também, enviou link para ver o famoso discurso de Jobs para os formandos de uma universidade de ponta nos EUA. O discurso é simplesmente brilhante. Muitas das falas me chamaram a atenção. Uma delas é quando Jobs disse que largou o curso regular na faculdade, pois custava muito dinheiro, e a poupança dos seus pais adotivos (eu não sabia que ele era adotado) estava sendo dilapidada por algo que ele não conseguia ver sentido. Ele começou então a literalmente “zanzar" pela universidade fazendo alguns cursos gratuitos. Um deles foi de Caligrafia. Sim, o gênio que revolucionou a forma como relacionamos uns com os outros no mundo moderno fez um curso de Caligrafia. Ele disse no discurso que algo que aparentemente não tinha qualquer relação, ou algo “útil" na vida prática moderna, foi o que mostrou para ele a importância da beleza e da estética. Foi por causa disso que ele se tornou tão obcecado com a aparência estética dos dispositivos da Apple, o que viria a revolucionar a informática e muitas outras coisas.

   Pensem sobre isso, colegas leitores. O Design de seu smartphone, se eventualmente você possui um, talvez tenha ocorrido porque uma pessoa fez um curso de Caligrafia. Logo, é simplesmente impossível saber as consequências ou relações do que eventuais eventos em nossas vidas podem ter no futuro. Desconfie de pessoas que ridicularizam a teoria ou práticas “não muito úteis” (na perspectiva única e pessoal delas) dando uma ênfase quase que absoluta à “prática" (seja lá o que essas pessoas possam definir o que seja “prática”).  Se, enquanto espécie, dependêssemos delas, teríamos uma vida muito, mais muito mais pobre em todos os sentidos. Não teríamos, com absoluta certeza, alcançado o desenvolvimento científico, tecnológico, cultural e humano que temos hoje em dia.

 Assim, de uma maneira quase “serendiptosa”, um simples comentário de um anônimo me levou a leitura de dezenas de artigos, a feitura de diversos textos (em processo de escrita) e a criação de um novo blog (em construção com a ajuda do colega Estagiário).  “Ok, Soul, sobre o que foi esse comentário, foi sobre o sentido da vida ou se há vida após a morte?”. Há uma cena que acho muito engraçada no filme “A Vida Secreta de Walter Mitty”. Como dizem os americanos “to make a long story short”, o filme tem como enredo a busca desesperada do protagonista  na procura de um negativo de uma foto que deveria ser supostamente a última capa da edição impressa da revista Life. Depois de muitas aventuras em volta do mundo, numa busca que se torna interior também, Walter Mitt descobre o negativo. Como a empresa está fazendo downsizing, ou seja despedindo quase todo mundo, há uma cena no elevador onde um dos seus companheiros de trabalho pergunta sobre o que tinha ma foto “Era por acaso a imagem do Pé-Grande ou do Mostro do Lago Ness?” querendo significar que uma busca tão intensa por algo, esse algo só pode ser uma coisa “grandiosa”. Fiz essa breve digressão apenas para que a pergunta de um leitor imaginário pudesse ser melhor entendida e para que assim pudesse ser um pouco engraçado. Aliás, o humor é essencial para que uma sociedade se mantenha saudável. Os Judeus faziam piada até mesmo sobre o seu destino trágico no holocausto conduzido pelos Alemães. Uma sociedade que perde a capacidade de ter humor ou que se ofende facilmente com brincadeiras sobre suas instituições, moralidade, religião, ética, etc, é um agrupamento humano com uma grande propensão a uma vida pior. Isso, evidentemente, também vale para indivíduos.

Cena do filme onde Walter Mitty descobre que há um negativo faltando na presença de seu colega de trabalho. Será que o comentário que aludo nesse artigo foi sobre algo extraordinário na vida?

   Não, o comentário não foi sobre a Teoria M (que tenta unificar os campos da gravitação e física quântica, o Holy Graal da física contemporânea), ou sobre como gerar Alpha (o sonho de qualquer investidor), mas foi simplesmente a indicação de um blog americano chamado Brave New Life.

   Eu irei, muito provavelmente no meu novo blog, falar muito sobre esse Blog e mais outros dois, principalmente focar nas diversas questões interessantes que eles abordam. Na bem da verdade, muitos dos temas ali tratados já foram objeto de reflexões aqui nesse espaço, mas é inegável que os blogs em questão falam de forma muito mais direta sobre assuntos de muito interesse a todos investidores amadores, cidadãos e seres humanos preocupados com a sua posição no mundo em geral. 

  O mais antigo chama-se Early Retirement Extreme, também conhecido pele acrônimo ERE. Como o nome diz, trata-se de independência financeira de forma muito rápida. O autor arrepende-se um pouco de ter colocado o termo “retirement” (aposentadoria), pela conotação que a palavra representa na sociedade. As palavras e os sentidos que elas tem em um determinado agrupamento humano contam e muito. É uma área do conhecimento humano que gosto bastante, mas não irei me estender aqui. O blog iniciou-se em 2007 e é um dos pioneiro no assunto na internet. O autor, Jacob, é um Dinamarquês que mora nos EUA, se entendi corretamente, que largou a profissão de físico profissional e hoje em dia vive financeiramente independente vivendo com menos de U$ 10.000,00 por ano. 

O autor do Blog escreveu um livro. Pretendo lê-lo quando tiver oportunidade;


  O Blog indicado pelo comentário é o Brave New Life. É a história de um engenheiro e a sua jornada de auto-conhecimento que o levou de forma sistemática a desistir de um emprego de U$ 170.000,00 anuais  (sim R$ 700.000,00 por ano) para viver com sua família de dois filhos com um orçamento em torno de U$ 30.000,00 anuais. O interessante é que a história dele em muitos aspectos se assemelha a minha. Ele tem 35 anos, durante os primeiros 10 anos de sua vida profissional teve uma alta taxa de poupança (muito semelhante a minha) sem saber muito o que fazer com isso, até que uns cinco anos atrás a ficha de muitas coisas começou a cair e a sua compreensão do mundo, sua vida, e o que ele realmente acha uma boa vida alargou-se de uma forma fantástica. 

  Por fim, o terceiro blog é o já clássico MMM, ou também carinhosamente conhecido como Mr. Money Mustache. Ele se “aposentou" com 30 anos de idade, como ele está atualmente com 40 anos, há uma década ele goza de independência financeira.  A forma dele abordar diversas questões é simplesmente fantástica. Ele, se não me engano, trabalhou como Engenheiro, exatamente como o Brave New Life.  Há artigos muito interessantes. A forma como ele discorre sobre a Taxa Segura de Retirada é muito boa mesmo. O artigo que ele trata sobre Margem de Segurança, e suas diversas camadas protetivas,  é como eu vejo a questão de independência financeira em meus modelos mentais, mas ele conseguiu traduzir isso em palavras, o que foi algo bem interessante. O texto que ele aborda sobre a ilusão da segurança era algo que eu estava a beira de escrever nesse espaço e devo fazê-lo em um dos diversos artigos que irei tratar sobre Taxa Segura de Retirada e Independência Financeira. Hoje de manhã, li o artigo onde ele fala que apego à luxo é apenas uma fraqueza humana, algo com o qual concordo plenamente, e já tratei do tema de forma indireta diversas vezes nesse espaço. Ter um sentimento de dependência ao luxo é a mesma fraqueza de ser dependente de uso de substâncias químicas legais ou não.

Mr. Money Mustache: belo bigode!

   O nível desses três blogs relatados é muito alto, algo que não se encontra muito por aqui. Infelizmente, eles são escritos em língua inglesa,e talvez isso afaste uma grande maioria de leitores brasileiros que possam ter dificuldade em ler textos em Inglês. O nível dos artigos, na maioria, é bem alto. Os comentários dos leitores, principalmente no MMM, são bons e às vezes muito instrutivos. Faço questão de ler todos os comentários, e muitos artigos interessantes de outros sites foram recomendações dos comentários. Os autores não caem em contradições lógicas banais, como muitas pessoas no Brasil atualmente o fazem, bem como sabem escrever de forma clara e precisa,  e saem dessa lógica preguiçosa intelectualmente entre "bons x maus, direta x esquerda", ou qualquer "Fla-Flu ideológico" que a sociedade brasileira infelizmente está tornando muito comum, sem se dar conta das consequências terríveis de médio prazo que isso pode ocasionar no tecido social. Leitura de alto nível e espero compartilhar alguns pensamentos deles por aqui.

  É evidente que o que eles falam não é novo. O MMM, por exemplo, até pouquíssimo tempo atrás não sabia o que era estoicismo, e nem sobre os estóicos. Aparentemente, ter contato com essa forma de pensamento teve uma grande influência em sua vida recente (ainda preciso ler o artigo em específico). Logo, como sempre disse o meu pai, em matéria de sentimentos e paixões humanas não há muito de novo sendo refletido pelos humanos. Entretanto, é inegável que eles - os blogs - trazem uma roupagem mais moderna e acessível para as pessoas, bem como conectam reflexões mais profundas de vida com finanças pessoais, um dos objetivos primordiais do blog pensamentos financeiros.

   Encerro o artigo recomendando fortemente a leitura dos blogs em questão para os leitores que podem ler em Inglês. Se a leitura no idioma do grande Escritor não é muito boa, desafie-se um pouco, faz bem para o cérebro. Acaso seja realmente difícil a leitura em outro idioma, prometo que vou tentar trazer muito dos temas abordados por lá para a nossa realidade brasileira. Por fim, coloco o famoso discurso de Jobs. Vale muito a pena assisti-lo, e agradeço novamente o anônimo que enviou o link.

                               Um discurso cativante, emocionante e inspirador. 

  Acabo esse artigo embaixo de um coberta na cidade bem pequena no meio das montanhas de nome Pai. Está frio, o que é algo unusual para a Tailândia. No caminho entre Chiang Mai e Pai eu e minha companheira fizemos amizade com um casal de americanos que mora no Alasca. Ele nasceu e cresceu no Havaí. Eu falei só pode estar de brincadeira! Quero morar no Havaí uns meses e quero muito viajar pelo Alasca. Que coincidência. Ele me contou cada história bacana do Alasca, que fez a minha vontade de conhecer essa região apenas aumentar. Comentei sobre o filme “Into the Wild”, e ele já tinha visto várias vezes, assim como eu. Muito interessante encontrar alguém que quando eu falo sobre a cena de um filme específico se lembra da cena em detalhes. Nos conhecemos por algumas horas, mas parecemos amigos que se conhecem há muito tempo. Estamos no mesmo hotel, e é incrível como quando estamos abertos a novas experiências, quando saímos um pouco da “defensiva" e interagimos com outras pessoas, podemos encontrar pessoas bem bacanas pelo caminho.

Essa noite na agradável cidade de Pai. Ela trabalha fazendo Café. Ele é DJ e cozinheiro. Acabou de comprar 2.5 alqueires de terra no Alasca e quer produzir a sua própria comida, bem como construir a sua casa com as próprias mãos. Ao se despedir para dormir, ambos deram um abraço bem forte na gente, algo inusitado para americanos, o que foi bem legal. Como é bom fazer amigos e procurar se dar bem com outras pessoas.



  Um grande abraço em todos!

segunda-feira, 4 de janeiro de 2016

TAILÂNDIA - UMA VIRADA DE ANO FABULOSA NA "CIDADE DOS ANJOS"

  Olá, colegas! Antes de mais nada, desejo um bom ano novo para todos. Eu, sinceramente, não me impressiono tanto com esse tipo de data. O eterno ciclo de finais e começos é bem conhecido na filosofia oriental, e está presente em muitos conceitos para vários correntes místicas dessa parte do mundo. Nós, ocidentais, até pela nossa raiz cultural e religiosa, não refletimos tanto sobre isso. Porém, parece-me evidente que o final de ano, mesmo que seja um dia como qualquer outro,  encarna o ciclo de fim-começo-fim,  pois parece ser para muitas pessoas  a oportunidade de um novo recomeço, onde todas as esperanças e sonhos podem se renovar, deixando para trás no ano finalizado eventuais frustrações. É claro, como é apenas mais um dia e as pessoas continuam exatamente as mesmas (assim como o mundo), que a esmagadora maioria dos sonhos e esperanças não se concretizarão no ano novo vindouro, mas para isso sempre haverá mais um ano novo, onde ter-se-á mais uma oportunidade para agora sim realizar todos os projetos que alguém eventualmente possa acalentar.

  Apesar de não ser um dia especial para mim, assim como o natal também não o é, eu desde jovem sempre compreendi o que significava para a esmagadora maioria das pessoas. São momentos alegres, onde as pessoas gostam de confraternizar umas com as outras, e isso é algo muito positivo, saudável e bonito. Bom seria se todos os dias fossem ano novo ou natal, como o mundo e nossas sociedades não seriam? Uma mudança tão simples de comportamento traria mudanças tão profundas na forma em que vivemos que nenhuma teoria filosófica, econômica ou política conseguiria prever. Logo, essas datas, por esse estado de humor das pessoas, costumam ser interessantes para mim.

  O meu ano novo não poderia ser mais diferente . Foi na “Cidade dos Anjos”, também conhecida por nós ocidentais como Bangkok. Já tive a oportunidade de visitar essa cidade muitas vezes, até porque junto com Cingapura e Kuala Lumpur, é um dos maiores hubs dessa parte do mundo. Foco nesse artigo apenas na minha experiência de ano novo nessa fantástica cidade.

  Em outras ocasiões já passei a virada do ano em lugares muito inusitados. Como esquecer a vez que estava em Hanói, capital do Vietnã, e os vietnamitas me confundiram com um jogador de futebol europeu famoso. Os vietnamitas são fechados no começo, mas basta abrir um sorriso para eles que eles retribuem com um sorrido ainda maior. Logo, foi um ano novo tirando fotos com inúmeras pessoas que pediam e sorrindo para dezenas, quiçá centenas de pessoas. Ou o final de ano passado no deserto de Thar na fronteira entre Paquistão e Índia (umas das regiões mais tensas do mundo) na presença de um guia chamado Mr. Desert. Tenho um vídeo que é um dos mais legais que eu já fiz, quando o mesmo improvisou uma queima de fogos no meio do deserto. Dormirmos a virada do ano literalmente a céu aberto, no meio de dunas, sendo acordado de noite por um cachorro que vinha nos acompanhando por algumas horas, num dos maiores sustos que já tomei. Ou o final do ano num dos lugares com as praias mais lindas do mundo: El Nido na ilha de Palawan, Filipinas. Tinha feito três mergulhos no dia e meu ouvido estava doendo,  a cada explosão de fogo de artifício era um verdadeiro martírio para mim. Ou, mais recentemente, no deserto ao norte do Peru, em Lobitos, um lugar com altas ondas no meio do nada. Enfim, já passei viradas de ano muito interessantes.


  Entretanto, esta foi a mais diferente.  Primeiramente, o ano novo para os Tailandeses é em abril, pois o calendário deles não é o mesmo que o nosso. Eles estão no ano 2558, não em 2016, já que levam em conta a vida do Buda histórico, não de Cristo. Porém, como é comum em países Asiáticos, eles “adotaram" esse dia como um motivo a mais para comemorar e unir-se com familiares e parentes. As festividades do ano novo Tailandês duram três dias e envolve basicamente reunir-se com amigos, familiares e refletir sobre ações feitas no ano que se passou. Uma tradição interessante é que eles jogam água uns nos outros, no que vira uma grande festa, simbolizando uma forma de purificação.

  A “Cidade dos Anjos” geralmente nessa época recebe muitos turistas estrangeiros. A Tailândia é visitada por 20 milhões de turistas estrangeiros por ano, o que é algo notável, pois o Brasil recebe apenas uns 5 milhões, o que mostra como nosso país é mal explorado em muitos setores, sendo o turismo apenas mais um deles. Logo, a festa de final de ano na cidade tem importância turística também.

  Eu e a minha companheira começamos a nossa peregrinação noturna pela cidade no dia 31 de dezembro indo para o enclave chinês da cidade, a famosa Chinatown de Bangkok. Já estou muito habituado com esse tipo de lugar. Comidas baratas de rua, várias barraquinhas e muita, mais muita gente. Após comer ostras fritas com uma camada de ovo frito em cima e uma bela cerveja local gelada, começamos a andar em direção ao centro histórico da cidade.

  Quando estávamos passando por um dos templos mais sagrados da cidade, e do país, chamado Wat Pho, ouvi  cânticos típicos de monges budistas. Eu simplesmente adoro a entonação dessa espécie de canto. Posso fechar os olhos e ficar ouvindo por muito tempo. Resolvi entrar no templo e fui surpreendido com o que vi. Além do templo iluminado de noite ser muito bonito, havia centenas de pessoas sentadas de branco entoando cânticos. Todas estavam com fios amarrados no corpo que por sua vez estavam amarrados numa rede entrelaçada de vários fios acima de suas cabeças. 



Percebam que todos estão com fios enrolados a cabeça que por sua vez estão todos conectados em fios esticados no teto num emaranhado de fios que talvez represente que todos nós estamos de alguma maneira conectados. Que mensagem linda, principalmente com tantas pessoas com ódio no coração contra pessoas diferentes, seja por causa de ideias, posicionamentos políticos, orientações sexuais, etnias, ou qualquer outra diferenciação que se possa fazer entre indivíduos que no fundo são apenas e unicamente humanos.

Linda Cerimônia

Essa foto foi tirada uns dias antes, quando por acidente descobri que o Wat Pho ficava aberto de noite e era de graça para visitar. Não havia ninguém e foi uma sensação extraordinária andar nesse templo iluminado sem ninguém (de dia há literalmente milhares de pessoas)


  Foi muito bonito ficar um tempo lá apenas assistindo. Minha companheira, no que foi um belo insight, disse-me que talvez as pessoas enroladas nos fios significava que todos na verdade estavam entrelaçados uns aos outros, num conceito que é um dos mais bonitos que eu conheço: o de unicidade. Não sei dizer se ela está correta ou não, apesar de ser bem plausível, mas é uma belíssima explicação.


  Saímos do templo e passamos por milhares de Tailandeses. Em inúmeros locais, havia diversas pessoas sentadas e orando, misturadas com alguns estrangeiros sentados ao lado, numa mistura muito bacana de culturas, etnias e religiões (apesar de eu não considerar o Budismo uma religião).  Isso para mim foi lindo de se ver, principalmente com tanto ódio existente no mundo em geral e em nosso país em particular.

                                          Countdown Thailand...

  Resolvemos então ir para um grande gramado que existe em frente ao Palácio real. Quando chegamos ao local, eu simplesmente não acreditei no que vi. Havia dezenas de milhares de pessoas sentadas, orando, muitas delas com as duas mãos em frente ao coração, uma forma tipicamente Tailandesa de se mostrar respeito e cumprimentar outros. Junto com a saudação japonesa de se curvar o corpo (algo que acho demais e sempre faço quando me despeço de um japonês - outra coisa que aprendi com japoneses é não entregar um objeto com apenas uma mão, mas com as duas mãos), é uma das mais belas formas de interação humana não-verbal que conheço.  

Quando olhei essa multidão sentada, de branco, orando e muitos com a mãos perto do coração eu simplesmente não acreditei no que estava vendo.



  Coordenando essa multidão havia  dezenas de monges num palco montado entoando cânticos. Nossa, foi demais. Quando o ponteiro do relógio marcou meia-noite, eu abracei a minha companheira e desejei feliz ano novo. Percebi que fomos os únicos, muitos continuaram simplesmente na oração. Quando belos fogos sobre o palácio começaram, os monges continuaram entoando cânticos e a maioria da multidão permaneceu sentada acompanhando os monges na cantoria. Foi lindo. Ver fogos iluminando uma das mais belas construções da Ásia, dezenas de milhares de pessoas sentadas entoando cânticos acompanhadas por inúmeros monges, foi algo muito especial mesmo.

Dezenas de Monges no palco (talvez tivesse mais de cem) entoando cânticos. Eu não consigo compreender nada, mas eles são tão belos e trazem uma grande serenidade para mim.
Fogos no Palácio Real ao fundo. Uma grande noite e um grande momento, sem dúvidas. Uma excelente experiência.

   Ficamos por um tempo e resolvemos voltar para o hotel. A rua onde ficamos em Bangkok, gosto muito de ficar nesse local, é do lado da famosa Khao San Road, conhecida como o coração Backpacker de toda a Ásia. A primeira vez que vi a mistura de estrangeiros, insetos fritos, barulho, cheiros, locais oferecendo shows de mulheres, massagens sendo feitas na rua, etc, etc tudo ao mesmo tempo,  foi algo extraordinário. Hoje em dia, ela não me atrai mais tanto. Nunca tinha visto a Khao tão cheia. Apenas estrangeiros, quase todos jovens, bebendo cerveja, ou qualquer outra droga alcóolica (não era nem duas da manhã e vi inúmeras garotas passando mal), dançando eletrônico. Foi como ir de um oposto ao outro. Ficamos algum tempo, na verdade para atravessar a extensão de toda rua demoramos uns bons 30 minutos e fomos dormir, felizes com mais uma grande experiência vivida.


  É isso, colegas. Grande abraço a todos!