terça-feira, 29 de julho de 2014

INVESTIMENTO - COMPRAS RECENTES DE FII E DE AÇÃO

              Olá, colegas! Hoje vou falar um pouco sobre operações que fiz essa semana. Primeiramente, talvez algumas pessoas já notaram, eu me interesso por temas mais gerais do ponto de vista das finanças, poderia dizer a parte teórica. Eu não tenho tanto interesse em saber o patrimônio das pessoas, bem como suas carteiras. É claro que esse é o ponto final num portfólio, os ativos que você decide comprar. Porém, para mim sempre são mais proveitosas as reflexões sobre os diversos aspectos dos investimentos, pois com base nesses aprendizados eu posso montar eu mesmo a minha própria estratégia e carteira. Porém, eu percebo que os artigos na blogosfera que abordam temas sobre rentabilidades, carteiras, etc, são  os aspectos que as  pessoas mais gostam de saber.  Nenhum mal nisso de forma alguma, apenas não é o que mais me atrai.

                Entretanto, hoje resolvi compartilhar algumas compras minhas e o motivo do posicionamento em alguns ativos. Vou citar o exemplo de um Fundo Imobiliário e de uma ação.

FII - TBOF

                O FII comprado foi o TBOF a R$ 62,20 (eu sou daqueles que acha que preço importa, principalmente em FII). Há um tempo fiz um artigo que ficou bem interessante, modéstia à parte, sobre parâmetros objetivos para análise de um FII. Vamos ver como se aplicariam os filtros a minha compra (http://pensamentosfinanceiros.blogspot.com.br/2014/05/fii-parametros-objetivos-para-analise-e.html).

Valor de Compra: R$ 62,20
Localização: Excelente. O que me leva a crer que o empreendimento será competitivo por muitos anos ainda.
Padrão Construtivo: Excelente. O que me leva a crer que não precisará de muita manutenção nos próximos 10 anos.
Valor do Aluguel: Está na faixa de R$ 120,00 o m2, o que é algo bem razoável pela localização e padrão construtivo do imóvel.
Valor Patrimonial: o deságio ao preço de compra de R$62,20 é da ordem de uns 35%, nesse preço o m2 está na faixa de uns R$ 11.700, o que é uns U$ 5.000 dólares (com câmbio a 2,3), o que também é bem razoável.  O HGRE vem vendendo imóveis com padrão construtivo e localização inferior a preços muito maiores, o que mostra que há realmente um deságio patrimonial. Caso haja retração imobiliária, esse deságio fornece margem de segurança, e há potencial de crescimento caso o mercado imobiliário se recupere no médio prazo;
Yield: A renda real por quota é de R$0,39, o que no preço de compra dá um yield anual de 7,5%. Esse yield é maior do que a poupança e significa 70% do CDI. É sempre bom lembrar que o yield de um FII é uma medida real, ao contrário da rentabilidade nominal do CDI e da poupança. Analisando friamente os retornos imobiliários de imóveis próprios seria um yield líquido muito alto. Porém, a renda potencial (caso a vacância fosse zerada) é da ordem de R$ 0,62/0,66 por quota, o que pode gerar um rendimento real líquido de 12% a 12,7%, o que é excepcional.  Portanto, mesmo que a vacância venha a ser zerada daqui 1 ou 2 anos, o yield potencial é muito razoável pelo custo de oportunidade que no presente caso não é tão alto. Além do mais, caso haja diminuição da vacância, é natural que o preço da quota vá se ajustando, o que pode oferecer um duplo ganho de rendimento, bem como de valorização patrimonial;
Tamanho do Fundo/Quantidade de Imóveis: É apenas um imóvel, mas o fundo é dono do imóvel inteiro, sendo mais de 50 mil m2 de área locável, o que é bem considerável;
Qualidade de locatários e duração dos contratos: Os locatários são pulverizados, o que de certa maneira diminui o risco de concentração. Os contratos firmados possuem duração de cinco anos. Logo, quando for tempo para renovação, talvez o cenário de oversupply já esteja mais amenizado (lá por 2017/2018);
Taxas administrativas: Médias. Algo em torno de 7/8% do faturamento, caso a vacância seja zerada corresponderia a 5/6%, o que é bem razoável.

                Portanto, colegas esses foram os filtros utilizados. Comprei algumas quotas apenas, início de posição e posição alvo bem menor do que fundos mais consolidados como  HGLG, FCFL, BRCR, etc. Caso o fundo seja mais penalizado pelo fim da RMG, creio que vou aumentando  mais fortemente a posição.

AÇÃO - GRENDENE

                A ação que comprei foi a Grendene. Não vou aqui fazer um resumo da empresa, pois isso pode ser encontrado em vários outros blogs, até porque é uma empresa que o pessoal gosta. Eu já tinha posição nela e aumentei.
Preço de compra: R$13,33
P/L atual = 9,24
P/VP = 1,94 (não é o que eu gosto, mas também não é muito descolado);
Dividend Yield = 6,9%, o que é bem razoável para um payout de mais ou menos 55/60%.
ROE = 21%
ROE de compra (ROE/P/VP de compra) = 11%. É igual ao ativo livre de risco, não é o ideal, mas está razoável
Dívidas = Empresa não tem dívidas relevantes, o que é muito bom, e diminui e muito o risco mais grave numa empresa que é a quebra. Costumo ser bem conservador em relação a dívidas;
Receita e Lucro = Crescimento constante nos últimos anos.
PEG = P/L atual dividido pelo crescimento do lucro nos últimos cinco anos = 9,24/10,74 =  0,86. Não é um número espetacular, mas é bem razoável, principalmente porque a empresa não possui dívidas.
Margem de segurança = utilizo uma calculadora simples de Fluxo de Caixa Descontado, costumo utilizar parâmetros conservadores (o que faz com que o preço da ação fique menor):
Parâmetros = crescimento de 10% nos lucros nos próximos cinco anos (abaixo do guidance da empresa e da média dos últimos cinco anos)
Perpetuidade = 5% (coloquei um valor que seja aproximado ao centro da meta da nossa taxa de inflação)
Taxa de desconto = 14% (11% da SELIC mais um spread de 3%. A empresa não possui dívidas, o que faz com que 3% pareça-me razoável).
O valor com esses parâmetros todos dá  R$ 20,xx, o que deixa uma margem de segurança de mais de 30%, o que é razoável.
Situação atual da empresa: como é uma empresa voltada para consumo, está sendo penalizada na bolsa. Além do mais, houve queda de volume de vendas no mercado interno. Tal queda foi compensada com um preço de venda maior dos produtos, bem como pelo aumento nas exportações. Portanto, no médio prazo a empresa tende a continuar pressionada, mas o aumento do câmbio, bem como uma maior participação das exportações nas receitas (o que vem ocorrendo nos últimos dois anos) pode de certa maneira ajudar a empresa a manter as margens e rentabilidade, mesmo em períodos mais fracos para o consumo interno. Além do mais, é uma empresa reconhecida pela sua administração boa e eficiente.

Eu prefiro comprar empresas em setores que estão sendo penalizados. É claro que não é garantia de nada, mas para mim é muito mais seguro comprar a R$ 13,xx do que a R$ 20,xx (cotação máxima nos últimos 12 meses) que aliás foi mais ou menos o preço “justo” segundo os meus parâmetros.

É isso colegas, está longe de serem filtros perfeitos, mas acho que eles são mais do que razoáveis para eu não fazer grandes bobagens e acertar mais do que errar na média.

obs: sempre fica aquele alerta que as informações aqui não são indicações de compra e não me responsabilizo por nenhuma decisão tomada nas informações aqui postadas, bem como pela acurácia das mesmas.

Abraço a todos!


sábado, 26 de julho de 2014

REFLEXÃO E HOMENAGEM - A BREVIDADE DA VIDA E INVESTIDOR MATUTO

            “O que é Tolerância? Trata-se de uma prerrogativa da humanidade. Estamos todos imersos em erros e fraqueza: perdoemo-nos reciprocamente as nossas tolices, eis a primeira lei da natureza (Voltaire 1764)

               Olá, colegas.  Um jovem de 25 anos chamado Dhyonata Willian Antonello faleceu. Ele também atendia pelo seu Nick de Investidor Matuto. Sim, era mais um colega, assim como eu, que se propôs a escrever e compartilhar as suas visões sobre finanças e sobre o mundo.

                Eu não o conhecia, e nunca tinha visitado o blog dele.  Hoje fiquei sabendo do seu falecimento e resolvi visitar o seu blog, bem como a sua página de facebook. Ao abrir o seu facebook, eu vi um rapaz sorridente. Ao ler os seus posts em seu blog, eu vi um sujeito que queria melhorar em finanças, que acalentava o desejo de um dia ser independente financeiramente.  Era um bom investidor? Cometia erros? Todas essas nossas angústias enquanto investidores empalidecem frente a um acontecimento que todos nós passaremos um dia.

                Sim, todos nós sabemos da nossa finitude, mas quando ela chega em pessoas tão jovens, realmente há um choque, pois parece que alguma coisa na ordem natural não foi respeitada. Eu sempre me lembro de uma frase de um filme belíssimo chamado “O Curioso Caso de Benjamin Button” quando o protagonista, Brad Pitt, ao ver tantos soldados mortos em uma batalha naval na segunda guerra mundial diz que a morte não parecia algo natural naquele ambiente.

                Como um admirador de vários conceitos budistas, eu realmente acredito que o nosso bem-estar e a nossa felicidade só podem estar no presente, pois o agora é a única coisa que existe. Nem o passado e o futuro existem, são apenas fragmentos de nosso cérebro que não existem na realidade. O presente tem esse nome, pois ele é uma dádiva oferecida a todos os seres vivos, por isso ele é um presente. É claro que vivermos no presente não quer dizer que não possamos projetar sonhos, estabelecer metas. Devemos fazer isso, pois muitas conquistas dependem de esforço e planejamento, e é da natureza humana entregar-se a sonhos. Isso é algo belo que devemos preservar.

                Porém, ao sermos confrontados com a falta de naturalidade da morte numa pessoa tão jovem como o Investidor Matuto, a lição pregada por Buda há mais de 2.500 anos atrás parece ficar transparente e clara como uma gota de chuva num dia de sol. Devemos fazer planos, mas devemos viver o presente com intensidade. Devemos dizer eu te amo hoje para os nossos pais, para quem tem a sorte de ter os pais vivos, e não amanhã. Devemos dizer coisas bonitas para a nossa mulher hoje, não amanhã. Devemos ser gentis com os colegas de trabalho, com o próximo hoje, não amanhã. Devemos fazer aquilo que nos faz bem hoje e não amanhã.

                Talvez para nós que dedicamos um precioso tempo da nossa vida para escrever sobre as nossas finanças, nossos aprendizados e erros e nossas dúvidas temos como objetivo principal a tão falada e sonhada independência financeira. Eu também a quero, afinal quem não quer ser livre, ainda mais nós ocidentais que damos um valor muito grande a liberdade. Porém, a IF não pode  ofuscar o agora. Podemos sim nos planejarmos, projetarmos, pouparmos, mas não podemos esquecer nunca que a nossa vida está acontecendo agora mesmo, não no passado, não no futuro, mas sim agora.

                Portanto, trilhemos o caminho da IF. Alguns atingirão mais cedo, outros mais tarde e outros talvez não alcancem. Porém, que todos vivam o caminho e aproveitem a jornada, de preferência sendo mais gentil com a família, amigos e desconhecidos. Talvez seja cada vez mais difícil, numa sociedade violenta, onde qualquer coisa é motivo para briga. Eu mesmo ontem quase me envolvi numa briga física, e me sinto arrependido, pois mesmo que eu por ventura poderia estar com a razão, a razão se perde quando nos descontrolamos e não respeitamos o próximo. Há brigas que infelizmente às vezes não podem ser evitadas seja a nível individual, seja a nível coletivo, mas que essas brigas sejam por coisas que realmente tenham sentido e importância, não por banalidades.

                Cometo muitos erros, tenho certeza que ainda há bolsões de vaidade dentro de mim, por isso peço escusas a qualquer um que eu possa ter ofendido, mesmo que não tenha sido essa minha intenção.  Acredito que Voltarie ao dizer “O que é Tolerância? Trata-se de uma prerrogativa da humanidade. Estamos todos imersos em erros e fraqueza: perdoemo-nos reciprocamente as nossas tolices, eis a primeira lei da natureza” foi extremamente feliz.  Perdoemo-nos mutuamente as nossas tolices e vamos tentar ter uma vida mais harmoniosa.


                Aos familiares do colega Matuto as minhas condolências.


sexta-feira, 25 de julho de 2014

REFLEXÃO - A REPÚBLICA DOS ADVOGADOS

                "A maioria  não tem apreço pelo que entende, e o que não compreendem ,veneram. Para serem estimadas, as coisas tem de custar: será celebrado tudo que não for entendido." (Baltasar  Grácian - 1647)

                 Olá, colegas! Nessa semana estou  mais motivado, e com várias idéias na cabeça. O artigo de hoje será curto, e talvez surpreendente para alguns. Vou falar sobre o número de faculdades de direito e de advogados no Brasil, e vou dar a minha reflexão sobre a razão dos números.

                Primeiramente, os colegas acham que seriam necessários mais advogados num país  onde há muita legislação e desconfiança mútua entre os membros da sociedade  ou numa nação onde a legislação é mais contida e a confiança um insumo importante do tecido social? A resposta óbvia seria apontar que o segundo país provavelmente vai precisar de menos advogados, pois seria uma questão econômica de oferta e demanda: como a confiança prevalece, não há tantos conflitos, não gerando demanda, o que acarreta uma diminuição da oferta de serviços jurídicos. Até aqui tudo muito intuitivo.

                Somos brasileiros e sabemos que o nosso país é complicado do ponto de vista de legislação. Legislação tributária extensa e confusa, leis previdenciárias complexas, leis longas e às vezes mal redigidas regulando quase todo aspecto da vida social.  Não acredita? Basta ver que o Estado agora quer regular até mesmo a relação de criação entre os Pais e os filhos, na famosa “Lei da Palmada”.  Soul, os pais não podem agredir os filhos. Claro que não podem, mas isso já era considerado errado, e em alguns casos tipificado até mesmo como crime. Logo, excessos já eram proibidos com a legislação vigente, mas se inventou de criar uma lei sobre esse tema.

                Além de termos uma legislação em abundância, a confiança não é o forte nos nossos relacionamentos do dia a dia. Quer comprar um imóvel? Contrate um advogado e tenha 10 pés atrás para não ser enganado. Quer fazer uma negociação comercial maior? Contrate um advogado e tenha 10 pés atrás para não ser ludibriado. A desconfiança impera hoje em dia no Brasil, o que é algo muito ruim, pois além de afetar os negócios (a confiança é a forma mais fácil e barata de se ter dinheiro), afeta também o nosso próprio bem-estar coletivo.

                Portanto, nós temos muitas leis,  algumas delas bem complexas, e um ambiente de falta de confiança mútua. Pelo meu raciocínio esboçado no segundo parágrafo, era de se esperar que aqui fosse um solo fértil para a existência de advogados. Os colegas que me conhecem um pouco sabem que gosto de quantificar as coisas. Ok, aqui é um solo fértil para advogados, mas quão fértil é esse solo? Muito é a resposta.

                O Brasil possui mais faculdades de direito do que todos os outros países do mundo juntos. Eu vou repetir o dado: em todos os outros países do mundo há menos faculdades de direito em número absoluto do que no Brasil. Um levantamento de 2010 apontou que o Brasil possuía 1240 cursos de direito contra 1100 no resto do mundo, ou seja, há 13% a mais de faculdades no Brasil do que no resto de todo o mundo. Olha, mesmo sendo da área e tendo refletido sobre o tema durante anos, esse número é completamente surpreende para mim. Para se ter ideia do gigantismo do Brasil nessa área, o Brasil forma bacharéis em direito todo o ano na mesma quantidade do número absoluto de advogados existentes na França.  É muito advogado. Todas essas informações podem ser consultadas aqui http://congressoemfoco.uol.com.br/noticias/brasil-recordista-de-cursos-de-direito-no-mundo/.

                Colega, os princípios econômicos geralmente se aplicam a perfeição em casos mais simples como esses. Só há um número exagerado de faculdades de direito porque o nosso país produz uma demanda exagerada por advogados. Seu pai faleceu? Se o patrimônio for razoável e houver uma mínima divergência entre os herdeiros, se prepare para anos no Judiciário, bem como para dividir a herança com novos herdeiros: os advogados. Contratou funcionários pela CLT, prepare-se porque em breve você vai precisar de um advogado. Quer pagar tributos e estar quites com todas as receitas federal, estadual e municipal? Prepare-se porque muito provavelmente vai precisar de um advogado.

                A demanda por serviços jurídicos é imensa no país, e por causa disso a oferta também tem que ser imensa. Fôssemos um país com uma legislação mais enxuta, onde a confiança prevalecesse mais sobre a desconfiança e com certeza o número de advogados seria bem menor.

                É evidente que a função do advogado é importante numa democracia, não há qualquer dúvida sobre isso.  Porém, uma sociedade onde o direito toma uma prevalência descomunal simplesmente sufoca esta mesma sociedade, principalmente na área produtiva da mesma. Precisamos de advogados, bons advogados, mas precisamos muito mais, no estágio atual do país, de bons engenheiros. Num país em que se forma mais advogados do que engenheiros (atualmente se formam entre metade e dois terços de engenheiros para o número de formados em direito)  vai ser difícil concorrer em pé de igualdade com potências tecnológicas.

                Não acredita? Na China, se formam atualmente cerca de 650 mil engenheiros, enquanto no Brasil são apenas 40 mil. São 16 vezes mais engenheiros formados por ano na China, enquanto a população lá é aproximadamente seis vezes maior. Logo, na China se formam quase 300% a mais de engenheiro per capta do que no Brasil (ver dados aqui http://www.confea.org.br/cgi/cgilua.exe/sys/start.htm?infoid=15360&sid=1206). Fica claro que a China está dando passos largos para ser um país de alta tecnologia num futuro não tão distante, enquanto o Brasil vai ficando cada vez mais para trás.

                É isso colegas, torcemos para que num futuro não muito distante, nossa sociedade possa produzir leis mais eficientes e enxutas, e que a atração por matérias ligadas a ciência atraiam mais cérebros do que matérias ligadas única e exclusivamente a solução de conflitos sociais. O desenvolvimento do nosso país precisará disso.

                Abraço a todos!


terça-feira, 22 de julho de 2014

EDUCAÇÃO E PRODUTIVIDADE - A VERDADEIRA GOLEADA VERGONHOSA

                      Olá, colegas! Fiquei um tempo sem escrever, pois algumas tarefas me tomaram tempo. Também fiz duas viagens em Finais de Semana, uma para o Rio de Janeiro na final da copa e outra para acompanhar o aniversário de um ano de um filho da minha prima. Ambas as pequenas viagens foram bem interessantes, e eu refleti sobre diversas coisas que poderiam facilmente virar uns 5 artigos, mas não vou abordar os diversos temas sobre os quais refleti nessas viagens nesse momento. O tema hoje é educação e a sua relação com produtividade.

            Antes de qualquer coisa, gostaria de falar brevemente sobre um assunto. Fiquei um tempo sem acessar os blogs dos demais amigos, e vi que o tema Brasil e sua comparação com outros países esquentou em alguns blogs, bem como nos comentários (refiro-me aos ótimos blogs do Corey e do Di Finance).  O artigo com mais visualizações do meu blog é disparado o que eu falei um pouco sobre o que eu penso do Brasil: http://pensamentosfinanceiros.blogspot.com.br/2014/05/brasil-e-tao-ruim-assim.html
Eu nem o acho bom, creio que já escrevi reflexões muito mais interessantes como a minha “trinca dos três”, onde fiz reflexões sobre ações(http://pensamentosfinanceiros.blogspot.com.br/2014/05/acoes-os-tres-fatores-de-risco-de-fama.html), dinheiro(http://pensamentosfinanceiros.blogspot.com.br/2014/06/reflexao-as-tres-finalidades-do-dinheiro.html), e ciência/egohumano(http://pensamentosfinanceiros.blogspot.com.br/2014/05/reflexoes-os-tres-golpes-da-ciencia.html). Porém, o mais acessado foi o sobre Brasil.

            É claro que devemos comparar o nosso país com países extremamente desenvolvidos. Eu já fui jogador semi-profissional de xadrez na adolescência, e a evolução vinha quando eu jogava com mestres ou grandes mestres, não quando eu jogava com jogadores de nível inferior. Sempre temos que nos desafiar e nos espelhar naqueles que são melhores seja em condutas éticas ou profissionais e o mesmo raciocínio se estende a comparação de países.

          A todo evidência não é olhar para a República Democrática do Congo (país que se diferencia do Congo, apesar de até mesmo alguns analistas não saberem disso) e achar que não devemos melhorar. Entretanto, e aqui divirjo de muitas pessoas, eu realmente creio que é importante saber o que acontece na RDC (e não são coisas nada bacanas, talvez seja o pior país do mundo para se viver), e não vejo como despicienda a comparação, muito pelo contrário, serve para não reclamarmos tanto (e a toda evidência isso não significa imobilismo ou aceitação) e principalmente, pelo menos para mim, para sentirmos compaixão por outros seres humanos. Veja, as pessoas que vivem na RDC sonham, sentem frio, amam, sofrem, querem prosperar na vida, assim como eu e você. São seres humanos com todos os anseios, medos e emoções assim como eu, você, um cidadão da Noruega ou o Warren Buffett.  Assim, temos que saber sim a nossa posição no mundo, como o mundo é, para que possamos ter uma perspectiva melhor sobre nós mesmos enquanto indivíduos, bem como nação, no caso do Brasil.

            Porém, o assunto desse artigo é educação. Pergunte para qualquer político ou cidadão o que fazer para melhorar o Brasil, e a maioria irá dizer “Melhorar a educação, pois a nossa está muito ruim”. É um lugar comum, mas que está certo. Porém, eu gosto de quantificações, a nossa educação é ruim, mas quão ruim ela é comparada com outros países? Esse é um tema já não tão discutido, pois quantificar problemas  é mais difícil e complexo do que apenas repetir conceitos  e ideias prontos.

            O quão ruim está a nossa educação? A resposta não é simples, e eu nem sou especialista no assunto, mas há uma série de dados que pode fornecer pistas valiosíssimas. Falo do teste PISA (Programme for International Student Assessment). Este é um teste feito pela OCDE aplicado de três em três anos em países membros da instituição, bem como em outros países que pedem para participar do teste. A prova é direcionada para alunos de 15 anos e procura medir as habilidades em três campos do conhecimento humano: interpretação de texto/leitura, matemática e ciências.

            Os resultados do Brasil nesse teste (que começou a ser aplicado no ano 2000 e o último foi feito em 2012) variam de horríveis a horripilantes. O resultado é muito ruim e a nossa evolução nos últimos 12 anos foi mínima (para um panorama geral dos resultados do Brasil veja http://educacao.uol.com.br/noticias/2013/12/03/pisa-desempenho-do-brasil-piora-em-leitura-e-empaca-em-ciencias.htm). Sabedor desses péssimos números, eu resolvi olhar um pouco mais o teste e tentar descobrir o que diziam os números.

            O teste PISA, de acordo com a pontuação, possui um sistema de classificação que vai do Nível 1 ao Nível 6. Basicamente, o Nível 1 significa que o aluno apenas consegue resolver problemas simples onde todos os dados para a resolução do problema são fornecidos explicitamente. O Nível 6 significa que o aluno consegue resolver problemas complexos sem que os dados para solução do problema sejam fornecidos de forma explícita. Colegas, o nível 6 é basicamente o que a sociedade do conhecimento irá cada vez mais exigir das pessoas. O que significa? Conto  uma história de um amigo meu para melhor ilustrar o conceito. Este colega foi consultor de estratégia em uma das maiores firmas do mundo, no seu processo seletivo algumas dessas perguntas foram feitas: a) Há no Brasil dois cachorros com o mesmo número de pelos?, b) Qual é o número de navios cargueiros no mundo (número aproximado, mas com ordem de grandeza próxima da realidade)? e c) É viável estabelecer um programa de internet a cabo (o teste foi há uns  8 anos atrás) em Cabo Verde? Se sim, por quanto em dólares?  Essas perguntas são feitas de bate pronto, não pode consultar internet ou se preparar, e mostram para o examinador a possibilidade de lidar com problemas complexos sem qualquer dado concreto fornecido, o que mostra, para as pessoas que conseguem lidar com esse tipo de problema, grande capacidade analítica, que é exatamente o que grandes consultorias de estratégia buscam.

            A toda evidência o teste PISA não vai medir em crianças de 15 anos habilidades analíticas tão finas, mas o Nível 6 demonstra que a criança chegou num nível de resolução de problemas muito alto, enquanto o Nível 1 mostra que basicamente a criança apenas consegue resolver problemas extremamente simples. Pois bem. Alguém imagina o percentual de Brasileiros colocados nos níveis 5 e 6 no último teste PISA nos três conhecimentos testados? Infelizmente, o número é sofrível e preocupante.

            O Brasil possui apenas 1% dos alunos nos últimos níveis em matemática, 0,5% em leitura e apenas 0,3% em ciências. Isso quer dizer que a cada mil alunos brasileiros, apenas três conseguem solucionar problemas mais complexos em ciência, por exemplo (se quiser conferir os resultados http://www.oecd.org/pisa/keyfindings/PISA-2012-results-brazil.pdf). No Japão, por exemplo, esses números são respectivamente: 24%, 18% e 18%. Isso quer dizer que a cada mil japoneses, 180 estão classificados nos melhores níveis em ciências, um número 60 vezes maior do que o Brasil. Como iremos construir uma sociedade próspera com números educacionais tão fracos? Como poderemos competir com o Japão nas cadeias globais de alto valor agregado com uma relação de um brasileiro preparado para 60 japoneses preparados? A resposta é que será impossível.

            Pô Soul! Você faz uma introdução gigantesca para falar que temos que olhar para todos os lados e não apenas para os melhores. Sim, falei. Vamos comparar com o Vietnã, um país que sofreu uma guerra sangrenta, que recebeu mais bombas americanas do que toda a quantidade despejada na segunda guerra mundial e que há 30 anos era extremamente miserável (mais sobre esse incrível país aqui no meu relato de viagem http://pensamentosfinanceiros.blogspot.com.br/2014/07/vietna-guerra-americana_3.html). Os números do Vietnã são: 13.3% para matemática, 4,5% para leitura e 8,1% para ciências. Isso quer dizer que o Vietnã possui 13 vezes alunos mais preparados em matemática, 9 vezes em leitura e 27 vezes em ciência. Sim, a situação da educação do Brasil é dramática.

            Quais são as causas para esse descalabro? O tema é complexo e não há resposta simples. Porém, ao contrário do que muitos podem pensar, a educação do Brasil não é tão subfinanciada como esses números podem levar a crer. Na verdade, os gastos com educação no Brasil giram atualmente em torno de 6% do PIB, o que é até um pouco acima dos gastos dos países da OCDE. Claro que há setores subfinanciados, mas parece que o nosso sistema é extremamente ineficiente, e colocar apenas mais dinheiro (e já foi aprovada no congresso medida para obrigar o gasto em educação em 10% do PIB) talvez não resolva problema e apenas faça que a nossa capacidade de investimento diminua ainda mais, e as contas públicas fiquem ainda mais sufocadas. Parece claro que o sistema educacional brasileiro precisa ser repensado urgentemente.  Há diversas conseqüências de um sistema educacional precário, aqui vou abordar apenas uma: a produtividade.

            O crescimento real de renda de uma nação pode ser quebrado em duas partes:

crescimento de renda = crescimento da produtividade + crescimento da força trabalhadora.

            O crescimento da força trabalhadora é o que vem sustentando o crescimento do Brasil. Não há nenhum mal nisso, pelo contrário. Os altos crescimentos dos países europeus entre as décadas de 50 a 80 são explicados pelo crescimento demográfico. Porém, o crescimento demográfico tem um limite, pois em determinado momento as populações se estabilizam ou começam a ter pequenos decréscimos (como é o caso dos países europeus e do Japão, por exemplo).  O Brasil está no que os demógrafos chamam de transição demográfica e os economistas de “plus” demográfico.  A população brasileira deve se estabilizar entre 2040/2050, e a nossa configuração demográfica parecer-se-á muito com a de um país estável europeu.

            Qual é o problema disso? O problema é que os próximos 15/20 anos são cruciais para que o Brasil possa se tornar um país mais próspero e rico para que possa melhor enfrentar os problemas de ter uma população envelhecida e um crescimento econômico mais modesto. Os países europeus já estão enfrentando o problema de ser uma sociedade mais estável demograficamente e com baixo crescimento, mas eles são ricos. O risco é o Brasil envelhecer e continuar sendo um país de renda média, aí temos o pior dos mundos: baixo crescimento com uma população envelhecida sendo um país de renda média. O ponto é que mesmo com crescimento tecnológico, há um limite para o crescimento da produtividade em países desenvolvidos. É difícil mensurar, mas há diversos economistas que estimam que o crescimento de produtividade em países de ponta deve ser da faixa de 1-1,5% real ao ano na segunda metade deste século. Logo, fica claro que em países pobres ou de renda média o crescimento da economia via crescimento populacional é importante, mas apenas o crescimento demográfico não é suficiente. São necessários ganhos em produtividade em larga escala para que os países mais pobres alcancem os mais ricos num processo conhecido pelos economistas como "catch up", e é o que vem ocorrendo com a China nos últimos 30 anos.

            Portanto, a questão da produtividade é essencial, eu diria vital.  Talvez seja o maior problema econômico brasileiro de médio/longo prazo. E como anda a nossa produtividade? Começo com um gráfico comparando a nossa produtividade com EUA e Coréia do Sul desde 1965:



            Em 1965, um trabalhador americano era 3 vezes mais produtivo do que um Brasileiro e 15 vezes mais produtivo do que um sul coreano. Em 2005, um americano era cinco vezes mais produtivo do que um Brasileiro e apenas 2,5 mais produtivo do que um sul coreano. Pode-se ver que o Brasil andou muito pouco em matéria de produtividade de 1965 a 2005, sendo que a Coréia do Sul voou e os EUA, apesar de já serem extremamente produtivos, continuaram crescendo. Reparem no gráfico como a década de 80 foi realmente perdida, pois além de não aumentarmos a produtividade, na verdade diminuímos a nossa produtividade. Porém, a situação é ainda pior, pois desde 2005 (data que esse gráfico acaba) o Brasil quase não obteve ganhos de produtividade, tendo um crescimento inferior a 1% (para uma resumo panorâmico sobre a nossa produtividade ver http://economia.estadao.com.br/noticias/geral,produtividade-brasileira-tem-crescimento-lento-imp-,875341).

            EUA e Coréia do Sul são países extremamente produtivos. Porém, quando a comparação é feita com os demais países, a situação do Brasil é muito ruim. Em um raking internacional que compara produtividades o Brasil está em 57ª numa lista de 61países(http://en.wikipedia.org/wiki/List_of_countries_by_GDP_(PPP)_per_hour_worked). Os dois gráficos abaixo dão uma visão clara de como está a nossa situação:



            Com uma produtividade tão baixa, como os salários poderão crescer e atingir níveis satisfatórios de renda? A resposta é que eles não irão crescer. Os salários vem crescendo de forma real no Brasil sem aumento da produtividade, e olha o que vem ocorrendo:


          Os gráficos foram retirados do relatório Empiricus. O último é o que os economistas falam "boca de jacaré" ao falar da produtividade e da demanda no Brasil. Vejam como a produtividade industrial quase não sai do lugar, enquanto a demanda cresceu fortemente a partir de 2008. Isso é insustentável no médio prazo, o que o Brasil já vem percebendo com inflação alta (o que é facilmente entendido por este gráfico, pois a produção não aumenta, mais a demanda aumenta, o que gera desequilíbrio e pressão inflacionária) e crescimento muito pequeno e um grande nível de retração na indústria. É por isso, colegas, que os salários aqui são muito menores do que nos EUA, por exemplo. Simplesmente não se pode pagar a mesma coisa para um trabalhador americano e um brasileiro, sendo que o americano é cinco vezes mais produtivo, sem gerar inflação e descontrole.

                Colegas, a produtividade está intimamente ligada com o nível educacional de uma população. Eu vi isso no Japão. Restaurantes onde no Brasil teria que ter 15 funcionários, quatro japoneses davam conta ou um sushi completamente automatizado com 4 funcionários, onde no Brasil precisaríamos de uns 20.  O grande problema é que se nosso nível educacional é baixíssimo, como poderemos consistentemente aumentar a nossa produtividade? A resposta é que não conseguiremos, não em níveis altíssimos como os países desenvolvidos se não atacarmos de frente o nosso prolema educacional.

            A situação é grave e séria, e deveria sofrer um intenso debate na sociedade, principalmente em época de eleição presidencial. Porém, creio que temas bem menos importantes terão prevalência, e o país irá adiar uma discussão que não poderia ser postergada, sob pena de plantarmos sementes muito ruins para o nosso futuro e dos nossos filhos. Muito pior do que tomar 7 a 1 da Alemanha, é ser goleado na educação e na produtividade, essa sim uma verdadeira derrota vergonhosa.

Sim, a nossa educação é mais vergonhosa do que o vexame histórico passado na copa. Afinal, o futebol é a coisa mais importante dentre as coisas sem importância e a educação é vital para qualquer povo.

            Grande abraço a todos!

sábado, 5 de julho de 2014

REFLEXÃO - NEYMAR E O VIADUTO

Olá, colegas. Duas fatalidades ocorrem nos últimos dois dias no Brasil e ocuparam espaços diversos na cobertura da mídia (na verdade centenas de outras devem ter ocorrido, quiçá milhares delas, mas vou falar de apenas duas). A primeira foi o desabamento de um viaduto em construção na cidade mineira de Belo Horizonte ocasionando a morte de duas pessoas e o ferimento de dezenas. O nosso querido amigo Uorrem Bife inclusive noticiou que mora perto deste viaduto. A segunda fatalidade foi a lesão do jogador Neymar, o mesmo teve uma leve fratura, terá que ficar de 4 a 6 semanas se recuperando e ficará de fora da copa do mundo.

“Soul, não sei onde você está querendo chegar, mas são coisas completamente distintas” alguém pode estar pensando, e são mesmo.  Numa, duas vidas foram perdidas e dezenas de pessoas se machucaram. Em outra, uma pessoa saiu lesionada e ficará de fora de uma competição esportiva. Às vezes, talvez porque hoje as nossas cidades possuem milhões de pessoas e não apenas alguns milhares como há uns 100 anos atrás, as fatalidades sejam apenas números para a gente. No caso do viaduto mineiro, as pessoas que perderam a vida se chamavam Hanna Cristina de 26 anos e Charlys Frederico Moreira do Nascimento de 25 anos. Ambos jovens, e provavelmente com uma vida longa pela frente se não fosse essa fatalidade. A Senhorita Hanna ainda deixou uma  filha de cinco anos (que saiu machucada do incidente), sendo que a perda da mãe dessa maneira com certeza será uma grande dor que essa criança terá que conviver pelo resto de sua vida.

                                                        Hanna Cristina 26 anos
                         Charlys Frederico Moreira do Nascimento  25 anos

Num mundo de notícias cada vez mais instantâneas e globalizadas, todos devem ter ouvido falar sobre o incidente em Belo Horizonte. Um viaduto desmoronou em cima de carros que passavam por debaixo do mesmo. Esse viaduto estava sendo construindo no contexto de plano de mobilidade urbana, cujo objetivo principal é melhorar a circulação de veículos na capital mineira. Esse viaduto era para estar pronto antes da copa, não depois. É uma mostra da copa que não deu certo, aquela que contrasta com a que deu muito certo dentro dos gramados e fora na animação das pessoas. Caiu por que estavam acelerando o ritmo da construção? Caiu por que falou fiscalização? Caiu por que faltou competência da empresa contratada? Obviamente, sem um laudo feito por especialistas é difícil dizer o que ocorreu. Porém, o simples fato é que viadutos não deveriam desmoronar sem a existência de algum choque externo como um terremoto. Para tal fato ocorrer, muitas falhas prévias existiram, falhas que infelizmente estão se tornando aparentemente normais no Brasil, o que resultou na morte de dois jovens.

E o que a contusão do Neymar tem a ver com isso tudo? Primeiramente, eu nasci em Santos, e durante muito tempo fui uma pessoa que torcia muito fortemente para o Santos Futebol Clube. O Neymar foi o melhor jogador que vi jogar no meu time, e ele sempre mostrou muito comprometimento com o clube. Além do mais, com ele o Santos voltou a jogar um futebol belo que encantou muitas pessoas. Por isso, eu gosto do jogador Neymar. Não é demais lembrar que o Neymar era acusado de “cai-cai”, constantemente ofendido pela mídia e torcida de outros times, e sempre recebeu o conselho de jogar na Europa.  Na sua despedida do Santos, num jogo realizado em Brasília, ele foi vaiado o jogo inteiro pela torcida. Ele inclusive foi vaiado num jogo da seleção brasileira. Por isso, aqueles que hoje lamentam a sua contusão talvez, pelo menos uma parte, são aqueles que vaiavam o mesmo quando ele atuava no Brasil junto da torcida brasileira.  Porém, isso foi apenas um aparte, não é o foco dessa reflexão.

O Neymar é um cara de 22 anos, ganha milhões de reais por mês e é querido por muitas pessoas. Logo, ele é um exemplo de sucesso para os nossos padrões atuais de sociedade.  No jogo de ontem, ele sofreu uma contusão de uma entrada maldosa de um jogador colombiano. Essa lesão o tirou da copa. Uma comoção se espalhou pelas redes de televisão e pelo país. “Força Neymar” é o que todos bradam, principalmente personalidades artistas e culturais do país. Eu também torço pela sua recuperação e lamento que a copa tenha acabado de uma forma tão triste e melancólica para ele.

         Momento quando Neymar é agredido pelo Jogador Colombiano Zuniga

Daqui seis semanas, Neymar provavelmente estará recuperado, vivendo uma vida que poucas pessoas podem ter. Daqui  a seis semanas a filha de Hanna continuará órfã. As perdas são em graus muito diversos. “Soul, eu concordo, mas assim é a vida, umas pessoas são mais famosas do que outras, morrem pessoas a toda hora, é copa do mundo, a notícia é o Neymar”. Concordo. Eu mesmo vi o jogo e não me abalei pela morte de dois desconhecidos. Quantas tragédias não ocorrem no mundo, e se eu ficar pensando nisso sempre e a toda hora, como vou viver minha vida? Porém, isso me leva a triste conclusão e constatação de como as nossas prioridades não necessariamente estão relacionadas com a generosidade, bondade ou justiça. De como os nossos meios de circular informação não estão preocupados necessariamente com a vida ou dignidade humana.

Há seres humanos que valem mais e outros que valem menos. Sempre foi assim na história. Alguns valem bem mais outros valem bem menos. Temos que conviver com essa característica de nossas sociedades humanas, porém é um pouco triste quando eu reflito sobre isso, pois me dá certa melancolia. Se nós medimos vidas e situações de forma tão diversa, será que discussões sobre Justiça, bem ou mal, não são todas de certa maneira hipócritas? Podemos falar que alguma injustiça é cometida contra a gente no trabalho, quando há dezenas de milhões de escravos ainda no mundo trabalhando para manter o nosso grau de consumo de classe média? Eu realmente não sei, e essa questão me acompanha há alguns anos.

Por fim, força ao jogador Neymar,  e estendo os meus sentimentos à filha da Hanna Cristina e aos familiares de Charlys Frederico Moreira do Nascimento.

Um abraço a todos.





quinta-feira, 3 de julho de 2014

VIETNÃ - A GUERRA AMERICANA

     Olá, colegas! Fazia tempo que eu não escrevia sobre viagens, mas neste artigo vou falar de um país muito bacana: o Vietnã. Essa nação localiza-se no sudeste asiático e vem se destacando recentemente pelo progresso econômico, sendo, se é que essa expressão ainda é utilizada atualmente, conhecida como um dos “novos tigres asiáticos”.

 A primeira coisa que deve vir na cabeça de muitas pessoas ao ouvir ou ler o nome desse país é “guerra do Vietnã”, porém, e essa foi a primeira lição que aprendi desse país fantástico, o nome que os vietnamitas dão a essa conflito é guerra americana, pois para a esmagadora maioria das pessoas com que eu conversei essa foi uma guerra iniciada por uma potência estrangeira, uma agressão externa. Isso é muito interessante, pois mostra concretamente como a visão sobre um fato pode ser bem diferente dependendo de sua perspectiva. É difícil dizer que algo é absolutamente certo (tirando em teoremas matemáticos), principalmente quando a percepção humana possui um peso relevante na questão.

O que foi a guerra  americana? Vou chegar lá, antes, porém, conto um pouco como é o Vietnã e o seu povo. Eu cheguei ao país por Hanói (a capital). A primeira coisa que impressiona para um marinheiro de primeira viagem no país é a quantidade absurda de motos que existe circulando, bem como a quantidade de gente que eles colocam numa moto (eu vi cinco pessoas), bem como o que eles transportam (eu cheguei a ver uma geladeira). Uma experiência única numa cidade grande no Vietnã é tentar atravessar uma avenida, é algo que num primeiro momento é aterrador, e depois se transforma quase que num jogo de adivinhação.  Para entender, apenas vendo um vídeo:

Reportagem New York Times sobre como atravessar uma rua no Vietnã
Vídeo  que retirei na internet sobre um turista atravessando uma rua. É exatamente assim, na primeira vez você fica paralisado ao tentar atravessar....

Eu cheguei ao país na virada do ano e foi uma experiência única e divertidíssima. Eles não comemoram a passagem do ano como nós, eles seguem o calendário lunar, mas mesmo assim a cidade estava bem animada com muitas pessoas na rua. Ao caminhar pela cidade, eu percebi que as pessoas, quase todos os jovens, me olhavam com uma cara séria e compenetrada. Num primeiro momento, achei bem estranha a sensação e pensei “nossa que povo carrancudo”.  Como as primeiras impressões apressadas geralmente estão erradas, foi só eu abrir um sorriso para as pessoas que todas começaram a retribuir com sorrisos ainda mais largos e com acenos de mão. Eu comecei, então, a andar na rua acenando para as pessoas e sorrindo e foi extremamente interessante. Algumas pessoas pediam para tirar foto, e apenas depois fui descobrir que algumas pessoas estavam me confundindo com um jogador de futebol famoso que jogava na Europa (não me perguntem quem), e foi muito divertido passar o fim do ano nesse clima. Falando em futebol, eu tomei café da manhã com alguns jogadores brasileiros profissionais de futebol que jogavam no Vietnã, mostrando que realmente somos uma potência quando o assunto é exportar jogadores de futebol para os quatro cantos do mundo.

Hanói é uma cidade bacana e onde está localizado, dentre outras coisas, o impressionante mausoléu de Ho Chi Min, ou como é conhecido no Vietnã o Tio “Ho”. Esse sujeito é um dos heróis nacionais do Vietnã, e acredite o Vietnã tem vários devido à sua história tumultuada, e teve papel central na independência do país, bem como na sua posterior unificação. Porém, um dos objetivos centrais da viagem para o Vietnã era conhecer a impressionante baía de Halong Bay, e meus amigos, que preciosidade para os olhos. Foi uma das paisagens mais fantásticas que já vi na vida, e lembro que para um dia dormindo em um barco, outro num hotel razoável com vários transfers inclusos, eu paguei a quantia de 45 dólares.  Sim, viajar pelo sudeste asiático é bem barato, e se pode fazer muita coisa com pouco.

          Halong Bay, um dos lugares mais lindos do mundo. Passei dias agradáveis nessa região.
Uncle Ho, uma das figuras centrais na história moderna do Vietnã.

Após alguns dias aprazíveis em Halong Bay, fui descendo o país e parando em algumas cidades muito bacanas como a antiga cidade de Hué, a aprazível cidade de Hoi An (muito bonita mesmo) e algumas outras. Na viagem, ia conhecendo mais vietnamitas, e ia vendo como eles são um povo trabalhador, como eles são empreendedores (até porque lá não deve ter tantos empregos formais como no mundo desenvolvido, e empreender um pequeno negócio talvez seja a única saída). O que eu senti nas semanas que passei lá é que são pessoas que querem superar o seu passado, é uma geração que quer dar uma vida boa para os seus filhos, e não se importa em trabalhar duro, 14/16 horas por dia. Há muito comércio de pequenas lojas no Vietnã, quase todas no mesmo local onde uma família muitas vezes numerosa dorme. Havia no ar um senso de transformação (e faz cinco anos que fiz essa viagem), uma vontade muito forte de prosperar, e foi essa a primeira vez que eu pensei comigo mesmo: “será que os países desenvolvidos têm condições de competir com essas pessoas tão determinadas”?  Eu não faço nenhum juízo de valor sobre se é bom ou não o ritmo ou empenho deles no trabalho, mas pode ter certeza que eles estão trabalhando muito duro para as coisas acontecerem.  Depois de passados esses anos, de conhecer um pouco sobre economia/finanças, eu percebo como algumas análises sobre a China, feitas por pessoas que talvez nunca foram a Ásia, são muito fracas. Eu não conheço a China, e ela está num nível muito superior ao Vietnã, e possui 1.3 bilhões de pessoas, mas se o ímpeto chinês for o mesmo que o ímpeto que eu vi no Vietnã, olha é difícil imaginar um mundo onde a China não tenha preponderância.

Portanto, os vietnamitas são simples, trabalhadores e querem fazer de tudo para viver o presente e superar o passado, mirando num futuro melhor para si, mas principalmente para a próxima geração. Eu disse superar o passado, não esquecê-lo, e isso nos leva à “guerra americana”.  O Vietnã é um país com uma história milenar. É uma história de muitas guerras e de um povo que sempre teve que lutar pela sua independência contra  alguma potência estrangeira. Para se ter uma ideia, o Vietnã teve que resistir aos mongóis (para quem não sabe o maior império terrestre que a terra já viu, não foi o império romano, mas sim o império Mongol), aos chineses, franceses e por fim aos americanos. Não vou me deter em detalhes históricos, até porque não tenho conhecimento para isso, mas sim nos acontecimentos que redundaram na guerra "americana".

O Vietnã em meados do século XIX foi colonizado pela França e foi incorporado numa região que viria a ser conhecida como Indochina (abrangia ainda os territórios atuais do Camboja e Laos). Após o final da segunda guerra mundial, como aconteceu em vários lugares do mundo, movimentos de independência do Vietnã em relação a França tomaram corpo, sendo que o  tio “Ho” teve papel fundamental, o que acabou desencadeando numa guerra entre nacionalistas com ideais comunistas principalmente no norte do Vietnã e tropas francesas, no que ficaria conhecido como guerra da Indochina. Os franceses foram derrotados numa das grandes batalhas da história do Vietnã, a batalha de Dien Bien Phu (mais informações aqu i http://pt.wikipedia.org/wiki/Batalha_de_Dien_Bien_Phu). Para os amigos terem uma ideia, a França cogitou de pedir aos EUA o uso de armas nucleares nessa batalha (sobre armas nucleares conferir o meu artigo sobre o Japão http://pensamentosfinanceiros.blogspot.com.br/2014/04/japao-flor-estupida-e-graciosa.html).

Após a derrota, os franceses se retiraram do norte do Vietnã, e o país foi temporariamente dividido entre Vietnã do norte com orientação comunista e o Vietnã do Sul. Para resolver inúmeras questões geoestratégias da região (Coréia, Indochina e a questão da unificação do Vietnã) houve uma reunião entre as principais potências do mundo naquela época, no que viria a ser conhecido como os “Acordos de Genebra” de 1954. Esse acordo, na parte que tocava ao Vietnã,  previa que em um ano haveria uma votação em todo o país para saber se os vietnamitas queriam a unificação entre o sul e o norte ou não.

Como a vitória na eleição seria pela unificação, muito pelo carisma e respeito que todos tinham por Ho Chi Min, os EUA apoiaram a decisão do Vietnã do Sul de não realizar qualquer consulta a sua população sobre uma unificação com o Norte. Devemos lembrar que estávamos entrando no auge da guerra fria entre EUA x União Soviética, e qualquer lugar do mundo era visto como um potencial lugar para conflito  de interesse entre essas duas potências.

A não realização da unificação, e a interferência excessiva dos EUA no Vietnã do Sul acabaram cominando na guerra americana.  Essa guerra possui muitas facetas e muitas histórias, foi a primeira guerra na história moderna a ter uma cobertura televisiva muito forte. Na mesma época, o movimento “Paz e Amor” do Hippies atingia o seu auge. As manifestações estudantis de Paris em 1968 aconteciam, eram um mundo em transformação, um mundo de efervescência, e não é à toa que muitas pessoas olham com nostalgia para aquela época (sem contar Woodstock, o homem chegando à Lua, etc).

"All we need is love"! Os protestos contra a guerra se intensificavam nos EUA, numa época de grande efervescência cultural.

Foi uma guerra sangrenta, uma guerra de guerrilha, com muitas histórias de horror e terror. Fala-se muito que Sadam Hussein usou armas químicas contra os curdos no Norte do Iraque no final da década de 80 (comandado pelo seu primo o infame “Ali Químico”) e que isso foi um crime contra a humanidade, e foi mesmo. Os EUA despejaram dezenas de toneladas de químicos no Vietnã, principalmente um composto conhecido como agente laranja (para uma reportagem completa sobre o agente laranja http://ciencia.hsw.uol.com.br/herbicida-agente-laranja.htm).  Foi uma guerra química suja e cruel dos EUA principalmente contra uma população civil indefesa. Na verdade, o papel dos EUA na região foi atroz, e teve conseqüências nefastas em outro país: o Camboja, mas pretendo contar essa história em outro artigo. Quando estive em Ho Chi Min City (antiga Saigon), fui a um museu onde muitos crimes de guerra pouco conhecidos por nós do ocidente eram mostrados. Para se ter uma ideia, o museu até um tempo atrás se chamava “As evidências dos crimes de guerra americanos”. O nome do museu foi trocado para “Museu da Guerra” num esforço para melhorar as relações diplomáticas entre os dois países que se normalizaram na década de 90 com a visita do presidente Bill Clinton ao país.

Ao fim, as tropas americanas e do Vietnã do Sul foram derrotadas, e o Vietnã foi finalmente reunificado em 1975. Geralmente costuma se falar apenas dos 58 mil americanos mortos na guerra. É difícil dizer-se ao certo quanto vietnamitas morreram na guerra, mas se estima que foram de 3 a 6 milhões de pessoas, o que seria quase um holocausto judeu da segunda guerra mundial. Infelizmente, não temos consciência do horror que foi essa guerra, nem dos incríveis custos humanos.

 Se milhares de soldados americanos sofreram e ainda sofrem, sendo que muitos deles morreram, pelo simples manejo do agente laranja, imagine as centenas de milhares de pessoas que tiveram esse produto despejado sobre suas cabeças, rios e plantações?
 A grande operação Tet, bem como o infame massacre americano no vilarejo de My Lai.
  Uma das imagens mais chocantes da guerra, menina corre nua com metade do corpo queimado depois de um bombardeio aéreo.


Após minha passagem por Ho Chi Min City eu fui para o delta do rio Mekong (o rio mais importante de todo o sudeste asiático), pois o objetivo era chegar a outro país extraordinário, o Camboja. Há vários filmes famosos que possuem a temática do Vietnã como pano de fundo, são filmes muito bons, eu gosto muito de "nascido em 4 de julho" com Tom Cruise.

Baita filme, recomendo. Conta a história de um jovem que não via a hora de ir para guerra e o seu retorno como veterano ferido em combate.


Vietnã, um país de guerreiros, de um povo que há milênios vem lutando pela sua independência contra inúmeras potências estrangeiras. Um país de pessoas simples, mas extremamente trabalhadoras, orgulhosos de seu país, marcados pelo seu passado, mas muito esperançosos no seu futuro. Um país com uma história impressionante, com pessoas muito orgulhosas de suas origens (e não apenas em copa do mundo) e com algumas paisagens de cair o queixo. Um destino que deveria estar no mapa de qualquer um.



Grande abraço a todos!