Olá amigos! Eu
iria escrever sobre outros temas, mas o colega Estagiário (que, aliás, possui
um belo blog) fez uma pergunta sobre quais seriam critérios para a escolha de
um FII. Tentarei abordar o que eu penso sobre esse tema. Gostaria de deixar
claro também que não acho FII a única forma de ativo para se investir, pelo
contrário. Investimentos diretos em imóveis podem ser muito lucrativos, assim
como investimentos em ações. A minha intenção de escrever tantos artigos sobre
FII é trazer uma luz para um assunto que na minha concepção é um pouco mal
interpretado: o caráter de renda fixa ou renda variável dessa classe de
investimento. E aqui as pessoas não tratam como renda fixa ou variável pelo
motivo da renda poder variar, o que é o tecnicamente correto, mas sim porque o
preço de negociação das quotas varia diariamente. Essa tendência natural pode
levar a equívocos na compreensão do que sejam FII, quais são suas vantagens,
suas limitações, e principalmente o que cada letra de negociação esconde. Bom,
o próximo post quero votar a falar sobre viagens, provavelmente falarei do
Vietnã. Espero que gostem do artigo, ficou grande, mas quando começo a escrever
às vezes me empolgo.
Obs: Algumas fotos para
ilustrar alguns FII são repetidas de outros Posts, apenas as coloquei para que
as letras de negociação citada possuam uma “cara” no mundo real.
LOCALIZAÇÃO
Comecemos
fazendo uma comparação com um imóvel próprio para alugar. Qual é a grande dica dos educadores financeiros
como um Mauro Halfeld da vida quando falam sobre imóvel para alugar?
Localização. Portanto, uma das primeiras coisas que devemos olhar para os
imóveis de um FII é a localização. É
claro que dependendo do tipo de imóvel, a localização pode variar. A
localização de um shopping é fundamental que seja perto de um grande
adensamento humano com grandes vias de circulação. A localização de um galpão
industrial é importante, mas não é um fator tão vital como a de um shopping.
Pode
dar um exemplo mais específico, Soulsurfer? Posso. O FMOF é um FII com um
prédio de bom padrão construtivo. Entretanto, se observamos as fotos de onde
ele está, fica claro que a localização não é o forte dele, pois fica
basicamente numa ruela. Isso quer dizer que o imóvel não vale nada? Claro que
não. Talvez ele tenha que se esforçar com um preço de aluguel de m2 competitivo
(menor) para atrair empresas onde a economia de aluguel é fundamental para os custos
da empresa. Sendo assim, o negócio não
é inviável, mas ele perde um pouco o brilho. Como há vários imóveis
corporativos muito melhor localizados, talvez não valha a pena comprar cotas de
um fundo como o FMOF.
Por
outro lado, vejam a localização do prédio eldorado que pertence ao porfólio do
fundo BRCR, e reflitam na diferença abissal com o prédio FMOF . É claro que aquele
é um prédio que vai se manter competitivo durante muitos anos pela localização
privilegiada. Sendo assim, como a maioria das pessoas quer comprar um imóvel
residencial bem localizado, com imóveis de FII não seria diferente.
Imóvel do FMOF. O padrão construtivo é bom, mas a localização não é das melhores. A foto engana um pouco, a localização é numa rua bem pequena.
Em comparação, observem a locação do prédio Eldorado pertencente ao fundo BRCR. Não há qualquer comparação
PADRÃO CONSTRUTIVO E IDADE DO IMÓVEL
Aqui, é exatamente a mesma coisa com
imóveis próprios. Imóveis dão manutenção, e quanto mais antigos mais manutenção
precisa. Imóvel se deprecia no tempo se não houver manutenção, ao contrário de
terrenos em grandes cidades que tendem apenas a valorizar, pois os espaços
disponíveis de terra nua vão ficando cada vez mais escassos com o passar do
tempo, obrigando que as cidades se expandam para novos eixos de desenvolvimento.
Assim como a idade do imóvel, há uma diferença grande entre padrões
construtivos. Há prédios que podem ser bons, mas perdem o encanto quando
comparados com prédios com excelente padrão de acabamento.
Ok, Soul, mas e aí como eu escolho?
Bom, vamos chegar lá, mas se as condições de preço forem idênticas, não faz
sentido escolher um prédio mais antigo e com um padrão construtivo inferior em
detrimento de outro imóvel com melhores características. Tudo muito instintivo
aqui.
Imóveis do FII BBFI. O imóvel de Brasília possui quase 50 anos de idade. Há sinais claros de deterioração, pesadas obras de manutenção e revitalização devem ser feitas para deixar o imóvel competitivo.
Padrão construtivo moderno, o prédio em si do fundo TBOF é espetacular. Logo, difícil comparar um prédio de 50 anos de idade com padrão construtivo inferior, com um prédio novinho em folha de altíssimo padrão. É evidente que o prédio mais novo e com melhor padrão construtivo tende a ser competitivo por muitas décadas ainda.
ALUGUEL COMPETITIVO
Essa característica já é mais sutil, e
às vezes passa despercebida para quem investe em FII, ou em imóveis para renda.
O que é um aluguel competitivo, e por que isso importa? Todo imóvel, seja
próprio ou pertencente a um FII, está inserido dentro de um contexto
mercadológico e geográfico. A demanda por aluguel vai influenciar a oferta de
imóveis para alugar e vice-versa, até que se chegue num equilíbrio. Sendo
assim, se o preço de equilíbrio para um aluguel residencial de um apartamento
de dois quartos com idade de mais ou menos 10 anos com 70m2 de área útil em
Moema/SP é na faixa de R$2.000/2.500 por mês (estou chutando aqui, pois não
faço idéia, e não fiz nenhuma pesquisa para deixar mais exato o exemplo), se
alguém anunciar um apartamento similar ao exemplo hipotético para alugar por R$ 4.000,00, provavelmente
demorará, isso se conseguir alugar, para locar o apartamento. Por outro lado,
se o anúncio de aluguel for por R$ 1.500,00 muito provavelmente a locação
dar-se-á com certa facilidade. Com um imóvel de FII é a mesmíssima coisa.
Se
o aluguel de lajes corporativas de uma determinada região para um determinado
padrão construtivo é de R$ 90,00 o m2, se o imóvel de um FII em RMG colocou no
prospecto que iria alugar por R$ 130,00 o m2, é muito provável que o fundo não
alugue pelo valor esperado no prospecto, mas sim pelo valor praticado no
mercado. Este, inclusive com os valores citados, é o caso do imóvel pertencente
ao fundo CEOC. O fundo não vai entregar a rentabilidade da RMG, porque
necessitaria alugar pelo valor previsto no prospecto, e se o fundo quiser locar
vai ter que alugar por valores menores daqueles previstos inicialmente.
Entendi, Soulsurfer. Para fundos que estão em RMG o valor do m2 projetado, e o
do efetivamente conseguido no mercado é
fundamental. Mas, para imóveis com locação já em andamento?
O prédio é novo. O padrão construtivo é bom. Entretanto, o aluguel projetado no prospecto não será atingido, já que os valores praticados pelo mercado na região são muito inferiores ao previso. Resultado? Diminuição do fluxo de caixa para o quotista, não é à toa que o fundo despencou 40% se comparado ao preço de emissão (pode talvez haver algum exagero em queda tão acentuada).
A lógica é a mesma, porém o que
vamos medir não é a capacidade de zerar uma vacância, mas sim a capacidade do
imóvel do fundo de se manter com vacância baixa, e essa diferença sutil podem
passar despercebidas por pessoas que observam apenas se o fundo está perfomando
sem vacância. Se um fundo possui um contrato de locação vigente com preço de m2
acima do praticado pelo mercado, a chance de acontecer uma das destas duas
hipóteses é imensa: a) revisional do aluguel para baixo ou b) término do
contrato sem renovação do aluguel, com comprometimento do fluxo de caixa. Logo,
se um fundo possui um contrato de locação nessas condições, a margem de
segurança de manutenção do fluxo de caixa do quotista pode ser mínima, e a
chance do fundo entregar rendimentos nominais decrescentes, ao invés de
crescentes (o que todo quotista espera para manter o poder de compra, ou o que
todo acionista espera para ver a cotação da ação subir) são consideráveis. Um
exemplo? O FVBI. Este fundo tem uma boa localização, mas ele possui um contrato
de locação com valor aproximado de m2 de R$150,00 e outro contrato de locação
com valor aproximado de R$190,00 o m2.
Tudo leva a crer que é o valor de R$140,00/150,00 o m2 que é o de
mercado atualmente, logo há o risco de diminuição do fluxo de caixa por uma
revisional negativa, ou até mesmo pelo aumento da vacância. Mesmo que o fundo consiga outro inquilino,
caso haja saída do imóvel do locatário que paga o maior aluguel, o fluxo de
caixa do quotista irá diminuir, pois o aluguel provavelmente estará em linha
com valores de mercado.
Prédio bom. Localização boa. Aluguel pratico pelo FII muito provavelmente acima do valor de mercado, o que torna o fundo um candidato para diminuição do fluxo de caixa para o quotista.
Por
outro lado, quando se consegue encontrar um fundo com aluguel cobrado abaixo do
valor de mercado, o quotista tem uma tripla proteção: a) a possibilidade
reduzida de interrupção do fluxo pelo aumento da vacância, já que dificilmente
um locatário irá sair de um imóvel onde o aluguel é abaixo do valor de mercado;
b) possibilidade de aumento real (acima
da inflação do fluxo de caixa) e c) serve como uma margem de segurança para
momentos de arrefecimento/crise no setor imobiliário. O item “a” é
auto-explicativo. O item “b” também o é, porém esmiucemos um pouco mais. Se um
FII possui um imóvel onde a média de locação por m2 é de R$80,00, sendo que a média da região para
a mesma espécie de imóvel é de R$100,00, quer dizer que há uma grande
possibilidade uma ação revisional positiva na Justiça, ou um incremento
significativo do aluguel quando da renovação do contrato ou da locação para um
novo inquilino. Sendo assim, se um fundo paga 10% aa de rendimentos, mas com
alugueis abaixo da média de mercado, há a possibilidade de um incremento na
renda no curto/médio prazo, fazendo que o yield passe para, por exemplo, 12%
aa. O item “c” é o inverso do item “b”, pois se o mercado se arrefece ou
declina, o fundo tem “gordura “ para queimar, já que os aluguéis estão abaixo
no mercado. Assim, se o aluguel médio da região cair 20%, o aluguel do fundo
estará em linha com o novo preço de mercado, dando uma margem de segurança para
que não haja redução do fluxo de caixa para os quotistas.
Portanto, numa comparação um pouco forçada,
achar um bom FII com alto yield e aluguéis abaixo do valor de mercado, é como
achar uma empresa com múltiplos fundamentalistas “baratos”, mas com grande
possibilidade de crescimento dos lucros. Há algum fundo assim? O que me vem à
mente é o MAXR. O Fundo hoje é negociado com deságio de mais de 40% sobre o VP,
o aluguel por m2 do fundo é extremamente barato (é uma média de R$10,00 o m2 se
não me engano), o fundo possui um portfólio razoável e tem um yield projetado
de 11/12% aa para os próximos 12 meses. A probabilidade de aumento real do fluxo de
caixa é bem grande aqui, o que pode fazer com que o rendimento passe para, por
exemplo, 13/14% aa, o que seria fantástico para os atuais quotistas. Por essa características
seria um fundo como uma bela margem de segurança em minha opinião (ATENÇÃO,
NÃO É NENHUMA RECOMENDAÇÃO DE INVESTIMENTO, APENAS UMA OPINIÃO PESSOAL, NÃO ME
RESPONSABILIZO POR QUALQUER TOMADA DE DECISÃO BASEADA ÚNICA E EXCLUSIVAMENTE
NESTES DADOS).
Fundo MAXR alugado para lojas de varejo. Possui um aluguel relativamente baixo para a média de mercado. Dizem que a chance de revisionais positivas para esse fundo é bem grande. Se vier, é só alegria, com yields que poderão ultrapassar tranquilamente os 13% aa.
VALOR PATRIMONIAL
O valor patrimonial é um filtro que é
desprezado por muitos, inclusive gente que entende bastante de FII. O valor patrimonial nada mais é do que o
valor atribuído ao(s) imóvel(is) de um determinado fundo (lembrem-se que estou
aqui tratando apenas de FII de tijolo).
Segundo a legislação vigente no país, os fundos são obrigados a fazer
avaliações anuais de seus imóveis. Apenas como ponto de interesse, não existe essa
obrigação nos REITs. Sendo assim para achar o NAV deles (o nosso VP) é preciso
se debruçar sobre os balanços e fazer estimativas. Neste aspecto o mercado de
FII é mais bem regulado do que o de REITs.
Soulsurfer, como essas avaliações são feitas? Elas devem ser feitas por
empresas independentes, e tentam levar em conta as diversas variáveis
econômicas (preço do m2 de aluguel, preço do m2 de imóveis com padrão
semelhante, taxa de juros, etc) que afetam o mercado imobiliário. Essas
avaliações são precisas? Difícil saber, pois é preciso olhar cada avaliação
particular, e em fundos que possuem vários imóveis a situação é ainda mais
complexa. Além do mais, dependendo das premissas adotadas pelo avaliador, se
mais otimistas ou mais pessimistas, a avaliação pode variar sensivelmente.
Ah,
uma análise com tanto “se” já vi que não serve para muita coisa, alguém pode
estar pensando. Não é um pensamento totalmente errôneo, mas ele não é tão
preciso em minha opinião. Por mais que as avaliações patrimoniais de um imóvel
possam conter algum grau de subjetivismo, o fato é que a probabilidade de se
ter uma avaliação muito divergente do que seria um valor patrimonial “justo” é
relativamente pequena, e a probabilidade decresce quanto mais vai se afastando
do valor arbitrado. Explico-me. Se você possui um apartamento, um corretor pode
te dizer que vale 400 mil. Outro pode dizer que vale 350 mil, e um terceiro
pode opinar que vale 430 mil. Entretanto, dificilmente você vai ouvir de um
corretor sério que o apartamento vale 600 mil ou 200 mil. O que isso significa?
A avaliação do valor patrimonial de um imóvel de um FII pode ter algum grau de
imprecisão, mas dificilmente esse grau será em percentuais tão gritantes como
no caso extremado do apartamento. Logo, se um VP da quota do FII SDIL hoje em
dia é estabelecido por uma análise independente em R$ 101,00 aproximadamente, é
difícil dizer se este valor é extremamente preciso, pois só dá para saber o valor
exato de um imóvel quando há uma venda ou uma compra, o que toda pessoa que
vendeu um imóvel sabe instintivamente. Entretanto, muito provavelmente se pode
dizer que o VP do SDIL não é compatível, no presente momento, com uma avaliação
da quota patrimonial do SDIL em R$70,00 ou em R$140,00. Quanto mais a distorção
aumenta para ambos os lados, mas improvável fica (seria um pouco aqui algo como
uma distribuição normal gaussiana, com a limitação dos resultados dentro do
número de desvios padrões. É claro que não é a mesma coisa, mas é uma forma fácil
de fazer alguma relação com um contexto estatístico/matemático
Se
alguém falasse isto: “ Estou
entendendo, Soulsurfer. O Valor
Patrimonial dessas avaliações não pode ser tido como de uma precisão absoluta,
mas ele ao menos é um indicador de onde o Valor Patrimonial da quota de um FII
pode oscilar.” Eu responderia: “Exatamente!”
. Entretanto, apesar disso estar claro,
outra pessoa poderia pensar, por qual motivo o Valor Patrimonial é importante
num FII de tijolo? Ora, colegas, o Valor Patrimonial é importante até mesmo no
mercado acionário, onde vários estudos apontaram que baixos VP explicariam o
excesso de retorno de muitas ações teoricamente subavaliadas (esse é um tema
bem mais complexo, mas o abordarei em outras postagens). Se o VP é importante
na análise de uma empresa, onde o dinamismo é muito maior, a contabilidade é
muito mais complexa, por qual motivo o VP não seria importante num imóvel
pertencente a um FII? Alguém por exemplo gostaria de comprar um apartamento
avaliado por três corretores em 300 mil por 330 mil? Eu creio que não. Ou
vender um apartamento avaliado em 200 mil por 130 mil (caso não precise de
liquidez imediata)? Eu também creio que não.
O exemplo da compra e venda acima ou
abaixo do VP de um imóvel residencial foi proposital, pois aqui reside o maior
argumento das pessoas que acreditam que o VP é terciário na análise da compra
de um FII. Se o VP é tão importante, dizem essas pessoas, compre 100% de um fundo com um grande desconto
no VP e ganhe na valorização das quotas. Esse raciocínio pode parecer coerente,
mas ele contém uma falha fundamental. Vejam, se num leilão eu observo um imóvel
que vale 800 mil, sendo negociado pro 450 mil, o processo de arbitragem é
simples. Se paga 450 mil, se vende o imóvel abaixo do valor de mercado
facilmente por 700 mil, e se embolsa a diferença. Um quotista de FII não pode
fazer isso. Não se pode comprar 1000 quotas do MAXR, fundo com grande desconto
no VP, e pedir para colocar os imóveis dos fundos a venda para que se ganhe
nesse processo simples de arbitragem. Portanto,
é óbvio que o Valor Patrimonial de um FII não se presta para fazer operações de
compra e venda como se fosse um imóvel adquirido diretamente.
Entretanto,
o fato desse tipo de arbitragem não ser possível com FII, tal fato de maneira
alguma retira a importância do VP. Cito três fatores importantes: a) se a
maioria dos quotistas resolver vender o imóvel(is) do fundo, muito
provavelmente será por uma oferta no mínimo igual ao Valor Patrimonial (o
administrador iria ter que dar uma bela explicação para sugerir uma venda
abaixo do VP, e mesmo que essa venda fosse aprovada pela assembléia de
quotistas, dependendo de como essa venda seja feita, se abaixo do VP, eu vejo
pelo menos possibilidade de questionamento judicial se algum quotista se sentir
prejudicado). Logo, se você tiver o seu Preço Médio acima do Valor Patrimonial
da quota, não poderá reclamar de absolutamente nada se o imóvel for vendido no
valor patrimonial; b) compras de FII com descontos substanciais em relação ao
VP, podem significar compras de imóveis com Cap rate altos, e conseqüentemente
yields potenciais altos e c) ao realizar compras com deságio no VP, como o VP é reavaliado ano a ano, o investidor se protege de eventuais turbulências no mercado imobiliário que podem fazer que os VP sejam diminuídos (sim, pode-se fazer um link aqui com a temida "bolha imobilária"). Logo, se comprar abaixo do Valor Patrimonial não te protege da desvalorização deste mesmo Valor Patrimonial por motivos que fogem do domínio do investidor, é claro que uma compra com deságio traz um "amortecedor de segurança" para esses eventos. Quanto maior o deságio, maior a segurança.
O
item “a” do parágrafo anterior é claro, mas e o item “b”? Vou dar um exemplo
prático. O FII EDGA em fevereiro deste
ano chegou a ser negociado a R$63,00 por quota.
Isso significava na época um deságio em relação ao VP de aproximadamente
37% (apenas lembrando o break even neste exemplo seria de quase 60%.
Break Even pode ser traduzido, nesse caso, como a quantidade necessária de uma
alta para igualar uma baixa. Logo, se algo cai 50%, o seu break even é de
100%). O EDGA possui, e provavelmente
entregará no segundo semestre, um rendimento potencial por quota de R$0,75 (e
se zerar a vacância de 3,5%, talvez o fundo possa chegar a R$0,8). Quem comprou a quota com esse deságio muito
grande em relação ao VP em fevereiro desse ano, simplesmente terá um yield de
14,2% aa (15,2% de yield potencial se a vacância zerar). Não preciso dizer,
colegas, que nenhum construtor conseguirá fazer um prédio tão bem localizado no
centro do RJ, e conseguiria um retorno potencial de 14% de aluguel líquido.
Isso é um valor absurdamente alto sobre qualquer parâmetro. Se levarmos em conta o IR de 27,5% para Pessoas Físicas sobre o rendimento de aluguéis (distribuições de FII são na maioria dos casos isentas) e uma taxa de administração de 10%, estamos
falando de quem comprou EDGA a R$63,00 de um CAP RATE bruto de absurdos 23% com os
rendimentos projetados (e um Cap Rate de quase 25% para o rendimento potencial
sem vacância). Esse número não encontra
nenhum paralelo no mercado de imóveis “reais”. Imagine alugar o seu apartamento
que vale 500 mil por 115 mil ao ano (500 mil x 0,23 – cap rate bruto do EDGA
com quota na mínima de fevereiro), quase 10 mil por mês. Ah, impossível Soul!
Pois é, foi exatamente o que ocorreu com EDGA a R$63,00. Se levarmos em conta que EDGA é um prédio que
parece uma obra de arte no centro do RJ com dezenas de locatários, a situação
fica ainda mais surreal quando comparada com um imóvel residencial e o seu CAP
RATE bruto em média de 4/5% aa.
Um imóvel como esse (parece a recepção de um cassino de luxo de Las Vegas) chegou a providenciar um CAP RATE de 23% (se considerarmos imposto para PF e taxa de 10% de administração), podendo gerar um yield líquido de 15% aa (se comprado nas mínimas de fevereiro)? É isso mesmo? E imóveis residenciais com um único locatário no Rio de Janeiro sendo alugados por um yield líquido de 2,34¨% aa (0,3% de aluguel bruto x 12 meses x 0,1 - taxa de administração x 0,725 - pagamento do IR). Só sete vezes de diferença. Sinceramente, eu não consigo ver a lógica desta distorção.
Portanto, descontos muito
acentuados em relação ao VP podem simplesmente indicar que há um exagero
acentuado no mercado, o que pode proporcionar yields muito significativos no
curto/médio prazo. Necessário destacar que ,como procurei mostrar na minha
série sobre REITs, descontos tão significativos sobre o valor patrimonial dos
REITs costumaram ter curta duração e ocorrerem apenas em grandes crises
imobiliárias, significando que há uma tendência de reversão dos preços
praticados no mercado para os preços de avaliação patrimonial.
YIELD
Esse
é o ponto principal, às vezes único, olhado por muitos investidores em FII para
decidir se vale ou não a pena investir num FII.
Também pudera, o que todo mundo quer ver é a maior quantidade de
dinheiro possível pingando na conta todo mês.
Não
há muito que falar neste tópico, apenas que altos yields podem vir à custa de
riscos maiores. O mercado pode ficar
“irracional” por algum tempo, mas geralmente ele precifica bem as informações
atuais. Logo, se há um FII rendendo mais do que outro FII, muito provavelmente
o FII de maior yield possui algum elemento de maior de risco (localização,
padrão construtivo, tamanho do fundo, etc).
Se por acaso um fundo com melhor localização, imóvel mais novo, com
desconto no VP em relação a outro fundo equivalente esteja pagando um yield
superior, então provavelmente é uma incongruência momentânea que não durará
muito tempo para ser corrigida.
TAMANHO DO FUNDO/ QUANTIDADE DE
IMÓVEIS
Este
é um tópico que fui convencido ao longo do tempo, pelas minhas leituras sobre
REITs, e pelo meu colega Baroni (um baita conhecer de FII, simpático, e que
está sempre à disposição para ajudar as pessoas com dúvidas no blog do
Tetzner). Hoje em dia, eu dou prevalência a fundos maiores. Não gosto mais de
fundos com poucos andares em um único empreendimento, por exemplo, razão pela
qual quero aos poucos ir vendendo minhas posições em BMLC, THRA e CEOC.
Além
dos fundos serem muito pequenos, e uma vacância, mesmo que parcial, comprometer
muito o fluxo de caixa desses fundos, os FII de poucos andares podem sofrer
concorrência dentro do próprio prédio, nisso o Baroni está coberto de razão.
Como assim Soulsurfer? Imagine que haja dois prédios com padrão semelhante e a
região desses empreendimentos está com uma demanda por locação moderada a fraca.
Num ambiente mais desafiador como esse, é possível que haja concorrência de
preços entre os prédios para atrair locatários. Se um FII for dono de apenas
alguns andares de um dos dois imóveis hipotéticos, então o próprio FII pode
sofrer uma concorrência interna, às vezes muito mais predadora do que uma
concorrência externa, vinda dos donos
dos outros andares. Imagine que o valor alvo do FII para locação seja R$100,00
o m2, mas algum dono de outro andar por alguma questão de necessidade de caixa
resolva alugar por R$70,00 o m2. Nessa situação fica difícil pensar que o FII
vai conseguir alugar os seus andares pelo valor inicial proposto. Por isso,
fundos donos de poucos andares num determinado imóvel costumam ser bem mais
frágeis. Ex: CEOC, THRA, VLOL, FVBI, BMLC, EDFO. Há um fundo que possui vários
andares em vários empreendimentos, o FFCI. Apesar de ter participação em vários
empreendimentos, geralmente são participações muito pequenas, e por causa disso
eu acho um fundo mais frágil.
A
quantidade de imóveis de um fundo apenas faz com que ele seja mais seguro, mais
diversificado, e não seja tão frágil a eventuais vacâncias temporárias. Há
vários fundos donos de vários imóveis: HGRE, BRCR, HGLG, MAXR, FIIP, KNRI, etc.
Por
fim, quero ressaltar que ao contrário do mercado acionário, onde faz todo
sentido possuir algumas small caps bem selecionadas na carteira de ações, pois
geralmente esse tipo de empresa é a que possui mais potencial para crescimento
acelerado dos lucros, o mesmo raciocínio não se aplica aos FII. Não há nenhuma
razão para se preferir fundos menores a fundos maiores, a não ser que haja
diferenças significativas em relação ao yield ou/e ao desconto sobre o valor
patrimonial. Se houver diferença entre o yield de um fundo maior e um fundo
menor, o investidor deve apenas pensar se um yield maior compensa o risco de se
posicionar num fundo de tamanho mais reduzido. É uma análise de risco x
retorno. Entretanto, se os yields forem equivalentes, não há qualquer razão de
ordem financeira ou lógica para se posicionar num fundo menor.
DURAÇÃO DO CONTRATO E QUALIDADE DO
LOCATÁRIO
Este
é um ponto fundamental, e é uma das grandes diferenças entre possuir um imóvel
próprio para renda, ou um FII fazendo às vezes de imóvel próprio para a renda.
Como já disse diversas vezes aqui nesse blog, dificilmente um investidor pessoa
física terá um imóvel locado para uma faculdade, ou para um banco como a Caixa
Econômica Federal ou para uma empresa como a Petrobrás. Por quê? Ora, uma
empresa como a Petrobrás precisa de espaços grandes, e os centros
administrativos precisam ser bem localizados. No mínimo a empresa precisa de,
digamos, uns 5.000 m2 de uma determinada laje corporativa. Se o preço do m2
dessa laje for R$ 10.000 o m2, e aqui estou sendo bem conservador, o investidor precisaria ter no mínimo R$50
milhões de reais, para ter um único imóvel hábil para ser alugado para uma
empresa do porte da Petrobrás. Veja, a quantia é absurdamente alta, e mesmo que
alguma pessoa física tivesse uma quantidade tão grande de dinheiro, faria
sentido alguém que possui R$55 milhões, colocar R$50 milhões num único imóvel
para alugar? Não, não faz sentido. Sendo assim, para se ter um imóvel de R$50
milhões, talvez o investidor devesse ter algo em torno de R$ 100 milhões pelo
menos.
Pelos
números envolvidos, já dá para perceber que o mercado de aluguel para grandes
empresas era, e continua sendo, restrito para investidores com muito
dinheiro. Os FII, e aqui é uma das
vantagens mais excepcionais deste tipo de ativo, vieram para possibilitar
que micro-investidores pudesse participar de algo que era restrito a grandes
players. Mas, Soulsurfer, qual é a vantagem de alugar para grandes empresas?
Olha, a vantagem de se poder agora pelos FII possuir diversos setores foi
abordada por este artigo aqui
http://pensamentosfinanceiros.blogspot.com.br/2014/02/como-estruturar-uma-carteira-de-fii.html. Não vou me alongar novamente
neste tópico. Entretanto, quero apenas ressaltar que o aluguel para uma empresa
como a Petrobrás pode ser um custo muito pequeno nas operações da empresa, ao contrário de uma pequena empresa de bairro, por exemplo. Empresas gigantes também
muito dificilmente vão dar calote numa simples dívida de aluguel. Logo, o risco
de inadimplência, que é enorme para quem aluga uma casa, uma saleta comercial,
é muito pequeno em boa parte dos FIIs. A vacância é um risco, como nos imóveis
próprios para renda, mas a inadimplência é um risco bem menor na maioria dos
FII.
É
evidente que o risco de inadimplência vai caindo de acordo com a “qualidade” do
locatário. Por isso, um FII com imóveis alugados pelo BB possui um risco menor
de inadimplência, do que um FII alugado para uma empresa menor. Portanto, a
qualidade dos locatários é um fator fundamental para se avaliar a segurança e
atratividade de um FII.
A
duração do contrato é algo mais relacionado a vacância, e não tanto a
inadimplência. Quanto maior a duração do
contrato, desde que a multa seja razoavelmente alta, mais o fluxo de caixa se
torna previsível, e a possibilidade de vacâncias inesperadas diminui
sensivelmente. Um imóvel alugado para o
Banco do Brasil por dois anos possui um valor muito diferente de outro imóvel
alugado para o Banco do Brasil por 10 anos (assumindo que os imóveis possuam
características semelhantes). É um
aspecto que dou muita importância, principalmente em um momento mais delicado
em que o nosso país atravessa. Contratos mais longos protegem o quotista contra
quedas do fluxo de caixa em caso de piora do cenário econômico. O inverso
também é verdadeiro: em caso de melhora do cenário econômico, um contrato mais
longo “trava” maiores ganhos com aumento de aluguel. Porém, aqui eu procuro optar pela segurança
da manutenção do fluxo de caixa, até porque os FII dentro da minha carteira
possuem a função precípua de ser geradores estáveis de fluxo de caixa para
pagamento de minhas despesas do dia a dia. Há muitos fundos com contratos longos
negociados no Brasil: SDIL, RBRD, FIIP, FCFL, AEFI, BBPO, XPCM, etc. Portanto, se deseja um fluxo de caixa mais estável, sem
solavancos, o filtro duração dos contratos deve ser essencial na sua escolha.
Quer viver de renda alugando um prédio moderno por 10 anos para uma das maiores empresas do mundo como a Petrobrás sem ser pelo FII XPCM? Creio que apenas desembolsando algumas dezenas de milhões de reais para ter essa oportunidade.
TAXAS DE ADMINISTRAÇÃO E COMPETÊNCIA
DOS GESTORES
Por fim,
chego ao último filtro. No meu último
artigo
http://pensamentosfinanceiros.blogspot.com.br/2014/05/investimentos-imoveis-proprios-fii-cap.html tratei das vantagens e desvantagens de ter terceiros administrando o
seu patrimônio no tocante a FII, portanto não vou repetir os mesmos argumentos
aqui. É indubitável que a integridade e competência do gestor é algo
extremamente importante. No mercado acionário a importância é ainda maior, ou
não é comum ver os investidores elogiando e acreditando em administrações como
das empresas AMBEV, EZTEC, CIELO, etc? Logo, uma administração competente numa
empresa é fundamental, eu diria que vital para o negócio de uma empresa
prosperar no médio/longo prazo.
E
no caso dos FII? Bom, eu não creio que uma administração extremamente
competente seja tão vital para um FII, principalmente os fundos mais passivos
(esmagadora maioria dos fundos em nosso mercado), como o é uma para uma
empresa. Um administrador incompetente em alguns anos pode destruir o valor de
uma empresa. Um administrador incompetente não vai destruir o valor de um
imóvel de FII, pode sim causar prejuízos aos quotistas, mas numa intensidade
muito menor do que uma má administração pode ocasionar a um acionista. E por você acha isso Soulsurfer? Um
administrador de um fundo imobiliário precisa manter competitivo o imóvel, escolher bem possíveis locatários e alugar por
preços que sejam competitivos. Um gestor de uma empresa deve conhecer muito do
ramo que atua, sempre estar preocupado com os custos, marketing, concorrência,
etc, etc. As variáveis são muito maiores,
do que simplesmente administrar um prédio ou um conjunto de prédios.
Entretanto,
mesmo que a administração de um FII não seja tão fundamental como a
administração de uma empresa no dia a dia, é evidente que um bom gestor não vai
deixa o imóvel ficar sem reformas necessárias por muito tempo, será seletivo na
hora de montar um mix de locatários, e procurará sempre gerar valor para o
quotista. Para administração de fundos
mais ativos (fundos que procuram crescer em tamanho com emissões de novas quotas
ou com dívidas com terceiros, fundos que compram e vendem imóveis na tentativa
de gerar maiores retornos aos quotistas), a administração ganha um relevo muito
maior do que para fundos passivos (fundo que possui um(ns) imóvel(is) e a renda
advém desses imóveis, sem que o fundo tenha a pretensão de aumentar de tamanho,
reciclar porfólio, etc), já que escolhas mal feitas podem destruir valor para o
quotista como: emissões de novas quotas em momentos inoportunos, compra de
imóveis no topo de uma valorização imobiliária, etc. Sendo que o reverso também
é verdadeiro em relação às boas escolhas.
Logo,
a administração de um fundo é algo que o investidor deve refletir antes de
investir num determinado FII. No mais,
eu não gosto de pagar taxas para fundos. Tenho verdadeiro pavor de fundos que
cobram altas taxas administrativas, pois isso é um dinheiro que poderia estar
indo para o quotista, mas está indo para os bolsos dos gestores. Infelizmente,
um dos fundos que eu mais gosto, o BRCR, possui altíssimas taxas de
administração, chegando a representar às vezes 20% do faturamento. Eu não gosto de investir em fundos com taxas
tão altas (e por essa razão que ainda não abri posição em KNRI, TRXL, apesar de
serem ótimos fundos), mas invisto em BRCR, pois eu creio que ele é o fundo que
mais se assemelha às práticas dos REITs americanos. Porém, creio que os
investidores devem pender para a escolha de fundos com taxas de administração
pequenas (o RBRD é menos de 5% do faturamento, o que é muito baixo), pois menos
taxas significa mais retorno para os
investidores.
CONCLUSÃO
Pô,
Soulsurfer, você listou 8 filtros, como escolher com tantos critérios? Olha,
colega, é a mesma coisa que escolher uma ação. Não se deve olhar os múltiplos
de P/L (yield), P/VP (valor patrimonial), Dívida (aqui não se aplica muito aos
FII), qualidade de gestão, qualidade dos produtos produzidos pela empresa (aqui
poderia se fazer um paralelo com localização e padrão construtivo de um imóvel),
vantagens competitivas (aqui poderia ser
aluguel competitivo e contrato longos com bons locatários num paralelo com
FII)? Pois então, devemos fazer a mesma coisa com os FII.
Devemos
procurador FII bem localizados, com bom padrão construtivo, com aluguel de
preferência abaixo do valor de mercado ou no mínimo em linha com o mercado, com
um bom desconto no VP, com um yield razoável, com um bom tamanho para não ser
frágil, com contratos longos com bons inquilinos, com uma administração com um
bom histórico e taxas administrativas não tão elevadas. Vamos encontrar vários FII com todas essas características
em momentos de normalidade do mercado? É mais difícil, mas nossa função como “investidores
inteligentes” (na melhor linha da escola do seminal Benjamin Graham) é ao menos
tentar, e saber o que estamos comprando quando investimos num FII
específico. O que para mim é melhor, é
que ao saber as qualidade que procuro num FII, ao saber os FII que podem
possuir muitas delas, em momentos de pânico no mercado onde a maioria estará
falando :“Eu não vou pegar faca caindo”, “Imagina depois da Copa”, “A coisa vai
afundar ainda mais”, um investidor que estiver razoavelmente preparado pode
aproveitar preços inacreditáveis como no exemplo do EDGA com um Cap Rate bruto
de inacreditáveis 23%, podendo ainda ser maior caso a baixa vacância seja
zerada.
É
isso pessoal, o artigo foi um pouco grande, mas acho que o tópico, para quem
quer investir em FII, merecia uma explicação mais detalhada. Um grande abraço
em todos!