Olá, prezados
leitores. Independência Financeira, a expressão mágica que cativa a tantos que frequentam esse espaço. Traduziram uma expressão do inglês, e adicionaram Aposentadoria Precoce à expressão mágica (Para quem não conhece, FIRE - Financial Independe Retire Early. Eu pessoalmente sempre achei uma bobagem traduzir essa expressão para o português). Lendo na última semana alguns
artigos, foram levantados questionamentos se vale a pena parar de trabalhar, especialmente
pelo conhecido blogueiro Corey. Pessoas escreveram artigos tentando colocar
outras perspectivas, comentários dos mais variados foram escritos, e eu resolvi
falar sobre o assunto.
Por qual
motivo? Porque o acho extremamente interessante atualmente? Não, por mim estava
mais a fim de falar sobre o hormônio insulina, e minhas experiências de meses
com o uso de um monitor contínuo de glicose implantado em meu braço. Mas, deixo esse assunto relacionado ao tema de
“biohacking” para outra oportunidade.
NUANCE. Sim,
em letras garrafais, nuance. Por qual motivo diversos textos meus se
esforçavam, ao menos na época que possuía mais empolgação com esse espaço, a
falar sobre nuances? Porque a vida é complexa e cheia de nuances. Simples
assim. Foram tantos e tantos artigos nesse
espaço tendo essa temática como pano de fundo. O último, por exemplo, sobre o
Irã e o escritor Taleb, é um texto basicamente sobre nuance.
Quando se
descobre que quase tudo na realidade possui camadas de complexidade, a vida se
torna mais difícil, mas muito mais interessante. Não existem respostas simples
para questões existenciais complexas que atormentam pensadores há milhares de anos,
meus amigos leitores. Porém, há alguns
caminhos.
Algum tempo
atrás escrevi sobre o ranking da ONU de felicidade dos países. Quase ninguém
conhece, alguns que ouvem a respeito criticam sem saber do que se trata, quem
procura conhecer um pouco vê que é uma métrica extremamente interessante. Não
vou entrar em detalhes, mas basicamente são analisados os seguintes parâmetros:
a) renda; b) liberdade; c) coesão social; d) generosidade entre membros da
comunidade e e) qualidade da saúde da população.
Sim, os
leitores libertários, ou aqueles que gostam e defendem a liberdade, tem razão,
ou parcial razão. Uma vida sem a possibilidade de fazer escolhas livres, sejam
econômicas ou políticas, é uma vida empobrecida. Porém, tudo se resume a isso? Pessoas
fazendo escolhas livres? Ou isso é uma descrição incompleta da realidade?
Sim, os
leitores com viés chamado “progressista”, tem razão, ou parcial razão.
Sentimentos como generosidade, coesão social provocada por uma sociedade que
não possua muitas fraturas e diferenças abissais entre os seus membros, também
provocam bem-estar humano, e por via de consequência felicidade. Porém, será que com apenas generosidade é possível fazer
uma empresa de aviação comercial operar 2000 voos diários pelo mundo afora ou é
necessário incentivo econômico? Será que os seres humanos não precisam ser
desafiados e recompensados de maneira diversa?
Sim, os
leitores que querem mais e mais dinheiro, possuem razão, ou ao menos uma razão
parcial. Países com maior renda possuem populações mais felizes. Stress
financeiro é uma fonte enorme de ansiedade, transtornos pessoais, desequilíbrios
mentais, ou seja, de uma vida mais infeliz. Porém, a solução para os problemas
da vida é mais e mais crescimento econômico apenas? Para alguém que possui R$
20 milhões, ganhar mais R$ 10 milhões irá resolver os seus problemas
existenciais? Seus problemas familiares? O seu filho passará a não consumir
cocaína por causa disso? Parece-me evidente que a vida é muito mais do que
isso, e que há um limite a partir do qual mais dinheiro não se transforma em
mais satisfação ou bem-estar, e há uma tonelada de estudos científicos
mostrando exatamente isso.
Por fim, eu
tenho razão nos últimos 12-18 meses, ou pelo menos parcial razão, de refletir
que o nosso principal bem é um corpo saudável. Do que adiante liberdade,
dinheiro e generosidade alheia, se estou fraco, sem saúde, doente, sem a
possibilidade de fazer movimentos mínimos, sem a possibilidade de aproveitar o
que a vida oferece? Mas, uma saúde
otimizada, um corpo forte, no meio de uma sociedade enfraquecida, com problemas
financeiros, e sem generosidade ou coesão social, poderá atingir todo o seu
potencial? Do que adianta estar saudável se sua família está adoecendo?
Logo, a vida é
composta por uma série de circunstâncias, algumas sobre nosso controle, outras
nem tanto, das mais variadas formas e sabores, e é o conjunto dessas
circunstâncias que fazem uma vida ser melhor, ou não, vivida.
Portanto, se
tornar independente financeiramente, é uma parte apenas de um grande
emaranhado. A melhor independência financeira não é ter um monte de dinheiro,
mas sim “fazer o seu trabalho como se fossem férias”. Achar algo significativo, algo que produza
valor para si próprio e para outros. Ter
dinheiro apenas facilita que esse algo significativo não necessariamente daí
precisa estar atrelado a um retorno financeiro. Um músico pode amar o que faz,
mas ele tem contas a pagar, tem desejos de consumo, e é necessário um retorno
financeiro. Um músico com alguns milhões pode se dedicar à sua paixão sem ter essa
preocupação. Por outro lado, um músico com alguns milhões talvez não tenha a
sede e o apetite que um músico que depende a sua vida do retorno de sua arte disso possui. É complicado, e não há
certo ou errado.
Possuir
dinheiro, perder a necessidade de trabalhar para alguém, não vai transformar um
relacionamento ruim num relacionamento maravilhoso. Não vai fazer com que o seu
filho o respeite mais, ou que você ache a iluminação. Não. Porém, pode dar o
tempo suficiente para que essas transformações sejam mais factíveis de ocorrer,
pois tudo que vale a pena na vida quase sempre envolve esforço. Criar um
relacionamento forte com o seu filho exige tempo e esforço. Tornar-se faixa
preta de Jiu Jitsu exige esforço e tempo. E, como já dito diversas vezes nesse
espaço, e parafraseando o grande ex-presidente Mujica, “TEMPO NÃO SE GANHA,
TEMPO SE GASTA”.
Em relação ao tempo, todos nós somos consumidores. Possuir certa quantidade de dinheiro, apenas
possibilita que uma fração maior de tempo possa ser dedicada para que inúmeras
transformações positivas possam ocorrer na vida. Ter dinheiro não garante que essas
transformações ocorreram, apenas possibilita, se a pessoa for sábia, a um uso
mais consciente da sua poupança de tempo.
Você, prezado
leitor, se possui quase 40 anos, não apenas possui mais uns 40-45 anos (se tudo
der certo) de vida, mas como você já morreu 40 anos. A morte já ocorreu para
você prezado leitor, e ela ocorre dia após dia. Tic Tac, Tic Tac, o seu encontro com ela fica
cada vez mais próximo. O seu tempo cada vez diminui mais, e não o contrário.
A solução para
esta angústia existencial é viver. Viver bem. Viver da melhor maneira possível.
Dia após dia, semana após semana, esse é o meu objetivo. Alguns dias eu vou
muito mal. Brigo com a minha mulher. Perco tempo com alguma bobagem. Alguns
dias eu vou muito bem. Leio um brilhante artigo científico, consigo acordar
cedo e pegar onda sem roupa de borracha, troco apenas sorrisos com a minha
mulher, aproveito essa frase incrível do desenvolvimento com a minha filha de um ano, faço exercício intenso, como uma pizza deliciosa, encontro com amigos.
Uau, isso sim é um dia bem vivido.
Tic, Tac.
Viva, meu amigo prezado leitor. Lembre-se que a vida é complexa, as questões
quase nunca são simples , e a nuance é a que traz cor e sentido para a
realidade que nos cerca. A independência financeira é um instrumento para
atingir uma boa vida. Eliminar o stress financeiro e o desperdício de tempo e
energia em atividades não tão satisfatórias realizadas apenas por dinheiro, é um grande
salto de qualidade de vida. É o único instrumento? Claro que não. Dizer bom dia
para os seus vizinhos e construir uma boa relação com os mesmos é outro.
Encontrar significado e sentido é mais um. Há tantos outros. O dinheiro e a
independência financeira são apenas instrumentos, nunca fins em si mesmos. E
eles são apenas uma ferramenta entre tantas outras.
Fácil? Não.
Complicado? Muitas vezes. Desafiador? Sem dúvidas. Essa é a vida, essa é a
minha vida, essa é a sua vida. Somos protagonistas das nossas próprias tramas,
num grande teatro onde não há ensaios, e onde a peça sempre se desenrola no
aqui e agora. Cabe a nós tentar ser os melhores protagonistas possíveis desse
nosso drama, até que as cortinas abaixem definitivamente.