“Eu comecei no
mercado financeiro sem muito conhecimento e muito confiante, aprendi a duras
penas que não poderia confiar tão cegamente nos meus instintos quanto se trata
de mercados. Não há dinheiro fácil!”. “Eu fazia Day trades, ganhei muito no começo,
mas acabei quebrando a cara e vi que não era tão simples, hoje escolho boas
empresas que possuem índices fundamentalistas excelentes”. “O pior inimigo do
investidor é ele mesmo”.
As
frases acima (inventadas) poderiam ter sido retiradas da história de
algum blogueiro de finanças, ou talvez de algum livro sobre investimentos. Em
certo momento, mesmo um investidor amador como eu, se dá conta que realmente o
maior adversário para bons investimentos é a própria pessoa. Livros clássicos sobre o tema dedicam várias páginas sobre a necessidade de o investidor conhecer melhor a si mesmo,
suas fraquezas, os seus receios, suas tolerâncias a riscos, e apenas depois de
um profundo processo de auto-análise, começar a esboçar algumas estratégias de
investimento para a perseguição de certos objetivos financeiros.
Isso
é ponto pacífico na técnica sobre finanças pessoais. Não há discussão a
respeito do ponto. Não há nenhum livro, ou autor sério, dizendo que é desimportante
saber suas próprias limitações, pois não teria nenhuma influência nos
resultados financeiros.
Mas,
se isso é verdade para finanças pessoais, seria para outras áreas da vida? É
importante se conhecer para melhor navegar pelas vicissitudes de nossa
existência? A resposta parece óbvia, não? Como saberei que hobby fazer, se eu
não me perguntar o que gosto de fazer? Como saber que trabalho se dedicar, se
não se pergunta o que se quer com o
trabalho? Como ter uma existência mais plena, se não se sabe o que são as
coisas e situações que levam a um maior bem-estar?
Isso
não é novo. Aliás, é muito antigo, e está quase que na gênese da filosofia
ocidental, e muito provavelmente oriental. Afinal, já há milhares de anos
estava escrito no Tempo de Apolo na antiga cidade de Delfos a célebre frase: “Conhece-te
a ti mesmo e conhecerás o universo e os deuses”. O processo de iluminação de
Buda foi um processo profundo de autoconhecimento. Logo, o autoconhecimento, a crítica pessoal,
é há bastante tempo celebrado como uma
das ferramentas mais importantes ao alcance de uma pessoa para a sua evolução, seja no ocidente, seja no oriente.
Porém,
voltemos para algo mais mundano como investimentos. Por qual motivo é tão
importante conhecer a si mesmo? Há diversas razões. Imagine tolerância a risco.
O que torna uma pessoa mais ou menos tolerante ao risco? Há explicações
genéticas . Há explicações epigenéticas. Há explicações ambientais.
Há explicações fisiológicas, como pessoas com maior nível de testosterona, por exemplo, tendem a ser mais tolerantes ao risco. Ou seja, é extremamente complexo para um terceiro explicar o motivo de alguém ser mais ou menos tolerante ao risco.
E
por qual motivo é importante saber a tolerância ao risco? Se uma pessoa com pouquíssima
tolerância ao risco resolve investir uma parte substancial do seu capital numa
operação mais agressiva, ou num ativo mais volátil, a probabilidade dela se
assustar com resultados negativos é muito maior, e com base emotiva, e não
racional, tomar decisões péssimas na pior hora possível.
Logo,
se essa pessoa realmente tivesse refletido sobre si mesma, sobre seus reais limites de tolerância ao risco de perda, ela provavelmente não faria um investimento
arriscado, ao menos não numa quantia razoável em relação ao seu patrimônio. A
pessoa, por um processo de autorreflexão, reconhece uma limitação sua, aceita esse
fato e segue com a vida. Nem todos
servem para serem empreendedores em áreas completamente novas. E não há nenhum problema com isso. Por outro lado, ao refletir profundamente sobre nós mesmos,
não descobrimos apenas falhas, mas também qualidades e pontos fortes, e isso é
fundamental para saber melhor aproveitar esses nossos pontos positivos.
O
processo de reflexão e autoconhecimento é para identificar pontos fortes e
fracos, para que aqueles não nos façam tomar decisões erradas e para que estes
possam fortalecer os processos decisórios.
Agora,
depois de uma página e meia de escrita, eu pergunto a vocês leitores: “Num
debate é mais fácil ter um bom desempenho quando desconhecemos ou quando
conhecemos o nosso antagonista?”. A resposta parece óbvia, pois ela é
intuitivamente óbvia mesmo. Quando eu jogava xadrez semi-profissionalmente, antes
da preparação de uma partida importante, procurava conhecer o estilo, as
aberturas, pontos fracos e fortes do adversário, especialmente se era uma
partida por um campeonato mundial (eu participei de alguns).
Quanto
mais é possível conhecer de um adversário, seus pontos fracos e fortes, melhor
é a possibilidade de se extrair uma estratégia mais eficiente para enfrentá-lo,
seja numa partida de xadrez, numa entrevista a um cargo, ou num debate
presidencial.
Falando
em política, mas isso se aplica a qualquer área, um erro comum cometido é não
reconhecer que o adversário tem qualidades. Isso é um erro primário, mas é
repetido muitas e muitas vezes. O viés
de confirmação e câmaras de eco (assunto tratado alguns artigos atrás nesse
blog) são aspectos que prejudicam o reconhecimento das virtudes de opositores.
Mídias sociais apenas amplificam esse problema. Porém, mesmo que seja cada vez
mais difícil, esse fato não impede que possamos quebrar esse ciclo, e
reconhecer as virtudes de idéias contrárias e de antagonistas.
Há
diversas razões pelas quais deveríamos fazer isso mais constantemente. Há uma
de ordem meramente utilitária. Ao conhecer os erros e virtudes de meus
adversários, ou de suas idéias, eu posso estar muito mais habilitado a traçar
estratégias efetivas para conseguir algum objetivo. Para além desse argumento, eu, Soulsurfer,
acredito que ao reconhecermos que nossos debatedores e contendores são tão humanos
como a gente, ao analisarmos que eles possuem pontos fortes e fracos assim como
nós, fica muito mais fácil criar laços de empatia. Empatia é a maneira mais
eficaz e fácil de criar relações mais construtivas e vidas mais significativas.
É a maneira mais fácil também de diminuir conflitos agressivos e comportamentos de
ódio.
Seja
qual for o argumento a se utilizar, a análise e a compreensão das posições e atitudes de outros é fundamental para que possamos traçar estratégias mais efetivas
no dia a dia numa gama variada de atividades e situações. Logo, se para você as
frases do primeiro parágrafo fazem total sentido, se “conhece-te a ti mesmo”
parece um dos conselhos mais sensatos já proferidos, a extensão lógica disso é
o esforço para entender e compreender as fraquezas e forças de oponentes
ideológicos, profissionais, amorosos, esportivos, etc.
Difícil?
Para mim, e creio que essa é uma das minhas qualidades, não é nem um pouco.
Porém, talvez isso se deve há vários anos de reflexão e tentativa e erro. Para
muitas pessoas esse tipo de conduta pode ser um desafio e tanto. Em última instância cabe a cada um decidir
como quer se portar na vida, mas saiba que a ignorância seja de si mesmo ou dos
outros sempre cobra um preço, e em muitos casos ele não é nada barato.
Um
abraço a todos!