Olá,
colegas. Hoje falo um pouco sobre as formas de crescimento de um FII. O texto
será baseado no livro “Investing in REITs” do autor Ralph L. Block.
Infelizmente, o Brasil é carente de livros mais técnicos em investimento na
língua portuguesa, ainda mais num mercado tão incipiente como o de Fundos
Imobiliários. Por isso, acho
interessante fazer alguns textos sobre o supracitado livro, considerado um dos
melhores livros texto sobre REITs.
Um livro essencial para entender mais sobre essa forma de investimento tão atrativa. Infelizmente, não há tradução para o português
Primeiramente, quero dizer que gostei da ideia do Além da Poupança de colocar uma música para se ler o artigo. Assim, coloco uma boa música para o restante da leitura.
Sonzinho massa do Man At Work:)
Basicamente,
há duas formas de crescimento do fluxo de dinheiro para uma entidade como um
Fundo Imobiliário: interno e externo. O crescimento interno é aquele que
acontece dentro de um portfólio imobiliário já possuído por um FII. É a tônica
do nosso mercado, pois a esmagadora, se não quase todos, maioria dos Fundos
Imobiliários apenas possui possibilidade de crescimento interno. Crescimento
externo é a possibilidade de geração de valores para os cotistas por meio de
aquisições ou desenvolvimentos de novas propriedades. Não é uma forma usual de se pensar o
crescimento dos FII no Brasil, apesar de ser a forma mais lógica e factível de
agregação de valor no longo prazo para o investidor.
CRESCIMENTO INTERNO
O
Livro “Investing in REITs” lista as formas de crescimento interno, comento
brevemente cada uma delas:
a) Aumento
dos aluguéis – Além do repasse da inflação, algo muito comum nos contratos de
locação do Brasil, é possível, a depender da situação do mercado imobiliário,
aumentos reais no valor do aluguel praticado. Aliás, foi a situação que
perdurou até pouco tempo atrás, com diversos FII conseguindo leasing spreads
altos.
b) Aluguéis
cobrados como uma percentagem do faturamento – Aqui, o fluxo de dinheiro para
os cotistas pode ser aumentado, se as empresas locatárias, desde que previsto
nos contratos, aumentarem significativamente o seu faturamento. Essa forma de
crescimento é quase que exclusiva de aluguéis em Shoppings ou Lojas Comerciais
como as detidas pelo fundo MAXR, por exemplo.
c) Melhoria
no mix de Locatários – Esse item também diz respeito a fundos de Shopping
exclusivamente. Imagine uma loja âncora num Shopping com a possibilidade de
atrair mais movimento para todo o shopping, aumentando assim a possibilidade de
aumentos no aluguel. É exatamente isso que
o FII PQDP está tentando fazer ao expandir o empreendimento e abrir uma loja
para famosa loja de conveniência Forever 21. Uma locatária como esta pode
aumentar e muito a circulação do Shopping, trazendo assim aumentos potenciais
no fluxo de caixa para os donos do empreendimento;
d) Reformas
na Propriedade – Esse é um item essencial não apenas para o crescimento do
fluxo, mas para a própria manutenção da capacidade de geração de dinheiro do
imóvel. Um fundo que não prestou muita atenção nisso foi o BBFI, e é inegável
que no estado que se encontra a sua capacidade de geração de fluxo de dinheiro
vai cada vez sendo menor. Reformas inteligentes, bem-feitas e bem executadas
(ou seja sem sobre preço) podem deixar
um imóvel competitivo por vários anos, além de ter o potencial de até mesmo
aumentar a capacidade de geração de dinheiro do empreendimento.
e) Vendas
e Reinvestimento - Esse é o que a
maioria dos investidores associam a um FII de gestão ativa. Um fundo que vende e compra
empreendimentos imobiliários. É chamado pelo autor do livro de “reciclagem de
capital”. O maior expoente no Brasil é o FII HGRE com quase uma centena de
unidades vendidas ao longo dos anos. É uma forma que pode agregar valor para o
quotista, pois se a administração é competente ela pode talvez ter a habilidade
de comprar e vender em momentos mais adequados. O HGRE vem sendo muito
competente nesse quesito. Entretanto, há
um limite, pois os FII por lei são obrigados a distribuir 95% dos lucros
auferidos semestralmente. Logo, como o Brasil é um país com inflação alta,
mesmo com uma equipe competente, fica difícil imaginar um fundo comprando
imóveis, os vendendo anos a frente, distribuindo 95% do lucro (boa parte dele
apenas reposição inflacionária) e sobrando dinheiro para comprar ativos
competitivos. Essa limitação leva-me a outra forma de crescimento que um FII
pode ter.
CRESCIMENTO EXTERNO
A) AQUISIÇÕES
Esse
tema vem bem a calhar com a oferta que mexeu com o mercado de aquisição do
controle acionário da empresa BRPR, tendo o FII BRCR como um dos protagonistas.
Antes de falarmos de aquisições, alguns conceitos básicos de finanças precisam
ser bem entendidos.
No
meu último texto sobre taxa de poupança, esclareci que só há dois modos de um
indivíduo acumular patrimônio líquido: ou se herda o capital ou se poupa parte
da renda para investimento em capital. Uma empresa, e vou igualar FII como se
fosse uma empresa, por seu turno, pode aumentar o seu patrimônio líquido (vou
desconsiderar doações) por meio de retenção do seu lucro operacional ou por
meio de captação de capital próprio. “Soul, endividando-se, a empresa não
aumenta o seu PL?”, alguém poderia perguntar e a resposta é não. Tomando dinheiro emprestado a empresa aumenta o seu ativo, mas não o seu PL. Imagine que um FII
possua 100M imobilizado e nenhuma dívida. Os ativos nesse caso são idênticos ao
Patrimônio Líquido de 100M. Vamos supor que esse FII tome emprestado 100M,
agora os ativos do fundo são equivalentes a 200M, as dívidas
são de 100M e PL permanece inalterado em 100M.
Como
dito no último item do crescimento interno, o caminho da retenção dos lucros é
insuficiente para os FII, já que eles têm que distribuir 95% dos lucros. Uma
taxa de poupança de 5% é minúscula e muito dificilmente um FII conseguiria
comprar um imóvel apenas com essa pequena retenção. Sobra para o FII captar dinheiro, seja
pegando dinheiro emprestado, seja captando dinheiro com novas emissões.
Aqui
há uma divisão bem nítida de onde vai vir o dinheiro. Ou ele vai vir do capital
de terceiros ou de capital próprio. Todo capital, seja de terceiro ou próprio,
possui um custo, pois o dinheiro, como já tratado no meu artigo sobre custo de
oportunidade, possui valor no tempo.
Quando falamos do custo de capital de terceiro esse conceito é lógico e
evidente. Se eu pegar dinheiro emprestado no banco, isso vai ter um custo na
forma de juros que ficarei obrigado a pagar. Se eu emprestar dinheiro ao Governo
por meio do Tesouro Direto, o Governo Federal obriga-se a pagar juros. O custo
nesse caso é bem fácil de se identificar: é o valor de juros devido pelo tempo
de duração do empréstimo. Como isso se relaciona com um FII e o tópico de aquisições de nova propriedade?
Vamos
supor que o FII HGRE quer pegar emprestado 200 Milhões de reais com uma taxa de
juros de 15% aa. Com esse dinheiro ele quer comprar um imóvel de escritórios com
potencial CAP RATE de 10% aa. Faz sentido essa operação? Vejamos. O banco terá
que pagar 30 Milhões por ano apenas de juros (200M x 0,15), enquanto poderá
receber apenas 20 Milhões de aluguel da propriedade (200M x 0,10). Numa primeira análise, parece claro que é uma operação que destrói valor para o atual quotista do Fundo. Agora, se os juros fossem de apenas 8% (16 Milhões), a operação começa a fazer sentido, pois o fundo terá dinheiro não só para pagar a dívida, mas para amortizar a mesma, gerando no médio prazo valor para o quotista na forma de aumento dos dividendo e do valor da quota no mercado secundário.
Portanto, é
bem fácil saber se vale a pena pegar dinheiro emprestado para comprar um
imóvel, basta comparar o CAP RATE potencial com o custo de se pegar capital
junto a terceiros. Quando se pega
dinheiro emprestado para comprar ativos, aumentam-se os retornos potenciais,
pois se usa alavancagem. Aumentando os retornos potenciais, aumentam-se os
riscos, pois caso haja problemas e o fundo não consiga pagar as suas dívidas,
os imóveis correm o risco de ser penhorados, por exemplo. O Brasil é um país
onde é muito caro pegar dinheiro emprestado, pois temos uma taxa de juros
básica muito alta. Logo, precisar de capital de terceiro para adquirir
propriedades é arriscado no Brasil.
E
o capital próprio, possui custo? Sim, colegas, e esse conceito a primeira vez
que me deparei com ele me confundiu um pouco. Quando alguém decide
participar de uma empresa ou de um FII na qualidade de proprietário, há
diferenças jurídicas em relação a um credor. Primeiramente, é sempre bom
lembrar que tanto o credor como um quotista de um FII, por exemplo, possuem
direito aos lucros do empreendimento. Entretanto, o credor deve ser pago
primeiro do que o quotista, ele tem preferência. Por seu turno, o credor possui
direito apenas ao que o FII deve contratualmente, ele não tem qualquer
participação em aumento dos lucros, como um quotista possui. Isso tudo é intuitivo, mas é importante para
lembrarmos que tanto credor como proprietário possui direitos em relação ao
FII. Por que alguém decidiria ser
proprietário de uma empresa ou de um FII, se não possui preferência quando da
distribuição dos lucros como um credor? A única resposta lógica é que ele
espera que os lucros sejam maiores do que os juros pagos aos credores.
Pensem
por um instante. Se eu tenho 200.000,00 para investir, e eu posso ou comprar
cotas de um FII ou emprestar dinheiro para o mesmo, se os retornos potenciais
fossem o mesmo, faria sentido comprar quotas do FII? Não, não faria. É por
isso, que quase sempre o custo do capital próprio é maior do que o custo do
capital de terceiros.
Mas,
qual é o custo do capital próprio? Aqui a resposta é muito mais complexa e
subjetiva. Se o custo do capital de terceiros é evidente, o mesmo não se pode
dizer do capital próprio. Teríamos que perguntar para todos os investidores
quanto eles esperam receber ao investir num determinado ativo. Obviamente, isso
não seria factível. Entretanto, a doutrina criou algumas formas de tentar
chegar a uma estimativa do custo do capital próprio, partindo de algumas
premissas.
Premissa
n°1: há um custo mínimo para o capital, e esse é fornecido pela taxa “livre” de
risco. No caso Brasileiro, vamos considerar a SELIC. Premissa n°2: para se
alocar dinheiro em algo diferente do ativo livre de risco, o investidor deve
ser recompensado por isso, deve receber um prêmio para tanto na forma de: x% +
SELIC. Premissa n°3: quanto mais arriscados forem os investimentos, tanto maior
deve ser o prêmio. Livros e livros são
escritos sobre essas premissas, discutindo qual é a melhor forma de se
quantificar essas premissas, mas não é o escopo aqui esmiuçar esses tópicos.
Logo,
para alguém comprar uma cota de FII, esse alguém, conscientemente ou não,
esperar ter um retorno maior do que a SELIC, nem que seja no médio/longo
prazo. Portanto, se um FII quiser
levantar capital na forma de novas emissões para adquirir propriedades deve
levar isso em conta, sob pena de ver frustradas suas tentativas.Assim,
se já é difícil se endividar por causa dos altos juros, se capitalizar no
Brasil com novas emissões é ainda mais caro, é por isso que em época de alta de
juros e pessimismo (onde os prêmios exigidos pelos investidores aumentam), não
há quase nenhuma emissão.
“E qual seria o custo de capital próprio de
um FII em sua opinião Soul?” Essa é uma pergunta difícil. Primeiramente, se
considerássemos apenas o custo nominal, seria quase impeditivo, pois com uma
SELIC a 12.25%, e mais um prêmio modesto de 3%, nenhum Fundo conseguiria
comprar um imóvel com CAP RATE potencial de mais de 15%, a não ser num grande
depressão com preços dos imóveis sendo jogados muito para baixo. Entretanto, os rendimentos provenientes de
aluguéis costumam ser uma medida real de rentabilidade, assim talvez faça mais
sentido comparar com a parcela real dos juros básicos. É baseado nesse
pressuposto que a Credit Suisse lançou aquele estudo apontando um prêmio de
4.5/5% entre os rendimentos médios dos FII e um título corrigido pela inflação
como um NTN-B ao longo dos últimos anos. Essa é uma forma razoável de se pensar o problema. Entretanto, é
sempre bom lembrar que os rendimentos dos fundos não necessariamente seguirão a
inflação no curto e médio prazo, basta ver os atuais leasing spread negativos
de muitas renovações, como foi o caso da renovação da PETRO no torre almirante.
Porém, em períodos mais longos de tempo, pode-se argumentar que os aluguéis
serão corrigidos pela inflação.
Assim,
para a média dos FII, pode-se dizer que nos últimos anos o custo do capital
próprio tem sido algo como JUROS REAIS NTN-B + 4,5/5%. Baseado nisso, pode-se
falar que o custo do capital próprio seria algo em torno de 10 a 11% de juros
reais. Fica evidente que qualquer emissão nesse cenário fica dificultada, pois
para valer a pena, e para criar valor ao quotista, tem que se comprar imóveis
com CAP RATE de no mínimo 12% (11% do custo do capital + os custos
administrativos ao incidir sobre o faturamento do aluguel), algo muito difícil
de se encontrar.
A
discussão é muito ampla, e de certa forma um pouco técnica. Porém, conhecendo
os conceitos, fica muito mais fácil analisar se a captação de fundos por um FII
faz sentido ou não.
O
crescimento de um FII por aquisições é muito bom. Se bem-feito pode gerar mais
segurança para o fluxo, já que serão mais imóveis, bem como crescimento desse
mesmo fluxo se forem comprados imóveis com ótimo potencial de médio/longo
prazo. Porém, infelizmente no Brasil, pela alta taxa de juros e altos prêmios
exigidos, essa é uma modalidade de crescimento que talvez demore para ser a
regra no país. Entretanto, estamos presenciando uma
possível aquisição enorme pelo BRCR, oxalá que seja bem-feia e gere valor para
o quotista do fundo.
B) Expansão–
Toda discussão sobre aquisições pode ser feita aqui. A expansão seria um
sub-tipo de aquisição, onde o fundo expande o atual portfólio com obras em
imóveis próprios. As expansões do FII TRLX, bem como do FII PQDP são exemplos.
C) Outras
Formas de renda – Aqui é raríssimo, e nem sei se existe no nosso universo de
FII. Seria a possibilidade do FII prestar serviço para outras empresas e gerar
renda com isso para o quotista.
É isso, colegas.
Espero que tenham gostado. Abraço a todos!