quinta-feira, 23 de agosto de 2018

O CENÁRIO POLÍTICO ATUAL E COMO CHEGAMOS NELE (SOBRE CÂMARAS DE ECO IDEOLÓGICAS)


                Olá, colegas.  Tudo indo bem em minha vida e principalmente na gravidez da minha companheira (o que é o mais importante). A Serena se desenvolve bem, e em poucos meses minha vida irá mudar de forma completa, e estou muito feliz com essa mudança. 

               Do ponto de vista financeiro, vendi muitos imóveis, alguns que pelo plano eu colocava como meta em setembro de 2019, o que vem me surpreendendo positivamente. Aliás, pretendo fazer talvez mais umas 5-6 operações e talvez parar de mexer com isso. A quantidade de patrimônio já está ficando de um tamanho onde será possível ter uma IF aqui, e outra no exterior (na verdade já é mais do que possível, mas eu puxei os números um pouco mais), com patrimônios separados, o que é demais até para um conservador como eu. 

             Do ponto de vista de saúde, estou muito bem também. Passado o período de adaptação, estou treinando de segunda a sábado todos os dias crossfit, e em alumas ocasiões  até mais de uma vez por dia. Estou gostando muito mesmo, e venho melhorando, apesar de ser um pouco atrapalhado, em várias técnicas, e a cada conquista de um movimento vem um grau de satisfação.

                Feito um update pessoal, começo o tema do presente artigo. Eu teria vários tópicos para escrever: colesterol, o que comer e o que não comer, como analisar uma evidência científica, entre outros, pois é a espécie de tópico que venho me dedicando mais nos últimos meses. Porém, decidi escrever sobre política.


REALIDADE – O GUIA PARA NÃO ACEITÁ-LA


                O problema da ascensão de tipos como Trump (este , aliás, vendo um monte de pessoas do seu círculo interno sendo condenadas criminalmente,  não se diferenciando muito do Lula) e Bolsonaro, na verdade há inúmeros outros problemas, é uma espécie de “infantilização” da análise da realidade.  O que quero dizer com isso? Muitas pessoas, de maneira infantil, querem que a realidade seja da forma como elas entendem verdadeira.  Se isso não ocorre, elas “choram”, “xingam” , fazem “bico”, ou, o que é mais comum, ignoram por completo informações discordantes.

                Com a penetração cada vez mais forte de mídias sociais no dia a dia de boa parte das pessoas, esse tipo de fenômeno (ignorar a realidade) é cada vez mais comum, e isso tem uma explicação muito simples. 

         Algoritmos extremamente complexos cada vez mais conseguem mapear as preferências dos usuários de redes sociais. Logo, as pessoas são “alimentadas” no seu feed de notícias ou curiosidades, com assuntos e abordagens que já previamente coadunam  com os pensamentos e idéias prévios. Isso nada mais é do que esses algoritmos explorando uma fraqueza mental humana chamada Viés de Confirmação. Esse viés cognitivo nada mais é do que dar uma prevalência muito maior a informações que corroborem o que previamente se pensa, e ignorando informações contrárias.

                Esse tema já foi tratado diversas vezes nesse blog. O viés de confirmação é a mãe, ou o Pai, de todos os erros cognitivos. É uma postura completamente anti-científica. As mídias sociais vêm apenas ampliando de forma assustadora os efeitos desse viés na sociedade.  Além do mais, mídias sociais permitem que aconteça de maneira muito mais acentuada o que se conhece como efeito câmara de eco.

                Veja o vídeo abaixo (sugiro que o mesmo seja assistido em sua completude):

"O Fuher lidera e nós seguimos!". "O Fuher lidera e nós seguimos!". Canta uma multidão hipnotizada depois de ser perguntada sobre se queriam uma "Guerra Total" (isso quando a Alemanha já dava sinais que perderia a guerra). Qualquer semelhança com o comportamento de certos líderes e muitas pessoas nos dias de hoje não é mera coincidência.


                Isso é efeito câmara de eco. Pessoas são expostas a opiniões e fatos num sistema bem definido. A opinião de um reforça a opinião do outro, criando a sensação de que aquelas opiniões e fatos são indiscutíveis e apenas um tolo, “um comunista”, “um fascista”, “um idiota”, "um ateu", "um infiel" ou qualquer outra coisa, não consiga enxergar o que as pessoas dentro de uma câmara de eco ideológico observam.

                O vídeo do célebre discurso “Guerra Total” de Goebbels mostra com perfeição os efeitos que o viés de confirmação junto com o efeito câmara de eco podem provocar. Esse discurso foi feito em fevereiro de 1943, quando a guerra já estava entrando numa fase desfavorável a Alemanha. O discurso não foi feito em 1940 quando a Alemanha visivelmente parecia ser indestrutível, mas sim em 1943. Logo, qualquer ideia contrária ou mais sóbria sobre se fazia sentido o povo alemão mergulhar numa “Guerra Total” seria completamente esmagada pelo ambiente criado pelo discurso.

                Mídias sociais servem como câmaras de eco. Os algoritmos escolhem as informações que apenas corroboram o que previamente achamos correto (viés de confirmação) e as pessoas alegremente compartilham isso com grupos de pessoas e amigos que comungam das mesmas opiniões.

                Por isso, as redes sociais podem ser extremamente deletérias para um debate produtivo, ao contrário do que se imaginava quando elas ganhavam mais tração e adeptos. Quando se é pego num loop de viés de confirmação e efeito câmara de eco, a análise da realidade fica comprometida, e há uma “infantilização” da análise da mesma.  Se a realidade não é o que o meu grupo acredita ser o correto, é mais fácil brigar com a realidade do que com as idéias do grupo.

                Não caia nessa, prezado leitor, a habilidade de analisar a realidade como ela se apresenta, e não como acreditamos que ela deveria ser, é de extrema importância para se compreender o que acontece no mundo, bem como para se criar estratégias de como agir neste mesmo mundo.


SOULSURFER EM 2016 AVISA

                Há mais de dois anos, logo após o Impecheament , eu escrevi (pode ser conferido aqui) , o seguinte:
 Sem perceber, estão criando condições para que o PT se reconstrua. Eu tinha escrito que achava que Lula estava acabado do ponto de vista de eleições presidenciais, assim como o PT. Ainda acredito nessa hipótese, mas não imaginava que se poderia fazer tanta besteira. 

 Quem trabalha com direito sabe que a pior coisa é não ter argumentos. Tudo o que um bom advogado precisa é um argumento. Não precisa nem ser bom, mas ele precisa existir. O PT estava asfixiado. De um lado uma presidente que estava indo contra tudo que ela  disse nas eleições, mas evidentemente o partido não poderia tirar o apoio a ela, pelo menos não oficialmente. Do outro lado, apanhava que nem cachorro nos casos de corrupção. Não havia qualquer argumento para o PT. Era agonizar até o final de 2018.

  Agora, o partido tem. Golpe e ataque a direitos sociais viraram o mote. Ele é bom? Não, não é, mas é um argumento. Fizeram um grande favor de tirar o enorme bode da sala que era Dilma Roussef. Se a crise institucional não se agravar, e absolutamente ninguém pode garantir o contrário, e realmente tivermos eleição em 2018, a ex-oposição pode esquecer que não terá muitas chance e desconfio que o PT, e os alegados 20% de votos do Lula, podem valer e muito para dar a eleição para um Ciro Gomes ou Marina.”


                Eu escrevia isso, pois num outro texto de alguns meses antes (pode ser conferido aqui), quando o impecheament da Dilma ainda não era uma realidade , afirmei  que o PT e o Lula estavam “acabados”. O que era algo incrível, tendo em vista a popularidade  de mais de 80% com a qual o Lula deixou a presidência.

                Porém, nesses dois anos motivos e mais motivos foram dados para que o argumento do PT e Lula pudesse ganhar mais e mais credibilidade junto a uma parcela maior da sociedade brasileira. Foram vários: malas de dinheiro de assessor do presidente Temer sendo ignoradas (mesmo com filmagem), fundamentações duvidosas no caso da condenação do Lula no caso triplex, denúncias contra o Temer barradas na câmara, a esdrúxula decisão do TSE sobre a cassação da chapa Dilma-Temer, etc, etc. Aliás sobre o TSE, foi isso que escrevi um ano antes da decisão:

“ Se o TSE não cassar a chapa Dilma-Temer, alguma coisa de estranho ficará no ar, pois ou as delações não são verídicas, algo que parece improvável, ou o TSE precisará de muito malabarismo intelectual e jurídico para se justificar

                Nem eu imaginava que o malabarismo jurídico seria tão grande. É evidente que fizeram bobagem. É por isso que Lula dos seus 20% de 2016 está em 40% pela última pesquisa datafolha. “Mas como, isso é um absurdo!”. “Mídias petralhas, pesquisas compradas”. “O Povo vai eleger o Bolsonaro no primeiro turno, isso é coisa de comunista”.  “O povo brasileiro é horrível mesmo, um presidiário liderando as pesquisas”. Sim, sim, amigos. Muitas pessoas vão dizer isso, numa análise infantil da realidade.

                O que é incrível, é que não sou profissional disso, não me interesso tanto pelo tema, não ganho absolutamente nada para refletir sobre esses temas e não tenho nem mesmo treinamento formal em ciência política, mas dois anos atrás me parecia óbvio que o cenário atual poderia acontecer, o que coloca em cheque muitas dessas análises feitas por profissionais de "consultorias políticas".

                Com 15-20%, Lula poderia no máximo pender para um ou outro candidato, e ter uma certa influência (por isso citei a Marina e o Ciro).  O PT não teria chances de voltar ao poder. Agora, com 40%, é bem provável que o candidato do PT apoiado por Lula (Haddad) chegue ao segundo turno com chances enormes de vitória se o outro candidato for o Bolsonaro.  Sim, no afã de prender o Lula a qualquer custo, de manter um presidente impopular e corrupto como o Temer, muitos contribuíram de forma inconsciente para ressuscitaram o PT e o próprio Lula.

               
O QUE ESPERAR AGORA?


                Muito difícil saber. Lula, condenado e preso, se concorre ganharia com folga, talvez até mesmo no primeiro turno. No segundo turno, ele ganharia disparado. O que dizer do nosso País numa situação como essa? Em segundo lugar, vem o Bolsonaro.  Em março de 2016 escrevi:

“    O meu maior receio é alguém sem qualquer preparo técnico, com clara tendência fascista como um Bolsonaro da vida, ganhe relevância maior do que merece, ao ponto de ser cogitado como um presidenciável com chances de ganhar. Espero que a maioria dos brasileiros, os que foram às ruas incluso, não queiram esse retrocesso institucional, pois além de um sujeito como ele não ter qualquer resposta para perguntas como gastos públicos, previdência, etc, ele ainda aprofunda receios, medos e preconceitos que realmente o Brasil não precisa"

                Eu nunca imaginei que o Bolsonaro tivesse chance de ganhar a presidência. O meu maior temor é que ele virasse uma força importante, e isso ele realmente virou, pois possui 20% das intenções de voto muito bem asseguradas. Para a esmagadora maioria desses 20%, tanto faz se ele recebeu auxílio-moradia  por vários anos(que ele mesmo diz ser imoral, o que é uma contradição clara e evidente no discurso fácil moralista dele), se ele é político há quase três décadas (mesmo com o discurso de renovação da política) ou se ele compara um negro a um porco, e depois diz que foi apenas uma brincadeira de mau gosto. Nada do que ele fizer ou disser vai mexer muito nessa margem consolidada dele. É como o cântico no discurso “guerra total”: “O Fuher lidera, nós seguimos” (“O Mito lidera, nós seguimos”).

                Essa é uma faceta de nossa sociedade, e é muito mais inteligente tentar entender porque tantas pessoas podem se deixar enganar por um sujeito tão despreparado, do que brigar com a realidade.  Eu acredito que Bolsonaro não tenha chances significativas no segundo turno, como sempre acreditei desde 2016, e as pesquisas demonstram que esse é o cenário mais provável. O que me assusta é que há mais de dois anos, já escrevia sobre o despreparo dele em lidar com questões simples que qualquer presidenciável sério deveria saber. 

                 Passou-se esse tempo todo, ele vem numa crescente desde então, e o cara ainda não conseguiu se preparar, nem que seja para enganar em respostas de 1-2 minutos, minimamente para perguntas que fujam de temas como “kit gay”, “política de gênero”, “porte de armas”, “e bandido bom é bandido morto”. É incrível. Qualquer pessoa em dois anos poderia ter se preparado minimamente.  

                O Brasil foi sendo empurrado pouco a pouco para essa posição paradoxal. Tenho a sensação de que a eleição de 2018 não irá apaziguar o país. Se o Bolsonaro eventualmente vencer, apesar de considerar difícil , o Brasil se tornará ingovernável mais do que já está. Se o Haddad vencer, é bem provável que o tumulto político e social continue e até mesmo se aprofunde.  A Marina talvez serviria para ser presidente, ou primeira-ministra, de países avançados como Dinamarca, Austrália, Nova Zelândia, e com a história de vida dela seria muito provável que ela se elegesse nesses países. Porém, creio que um governo com ela, com o sistema político atual, o Brasil também tenderia a aprofundar a ingovernabilidade, pela ausência total de apoio a ela.

                Os dois candidatos que talvez pudessem ter mais força e governabilidade seriam Ciro Gomes e principalmente Gerald Alckmin, mas não acredito que eles tenham forças para chegar ao segundo turno.  Portanto, o Brasil caminha para continuar com mais anos turbulentos pela frente do ponto de vista político e econômico.

                Terminando esse artigo, concluo orientando todos a fugirem de câmaras de eco ideológicas. A maneira mais fácil de fazer isso é saindo de redes sociais e procurando informações contrárias ao que você, prezado leitor, acreditar ser verdadeiro. Apenas assim a percepção da realidade é aumentada e a nossa capacidade de compreensão da mesma.
              
                     Abraço a todos.